quarta-feira, 27 de novembro de 2013

Reportagem  de Péricles de Oliveira, publicada no jornal Brasil de Fato em 06-08-2013. 

Perante uma atenta plateia composta por mais de 3 mil pessoas, a renomada cientista indiana Vandana Shiva (foto) fez uma palestra de uma hora, respondeu a perguntas e encantou a todos com suas ideias, experiências e convicções, durante a abertura do III Encontro Internacional de Agroecologia, no dia 31 de julho, na cidade de Botucatu, interior de São Paulo.





Vandana foi muito contundente ao longo de toda a sua fala. Começou contando de sua vida, de como havia estudado biologia e física quântica na universidade e de como se considerava uma pessoa alienada da realidade do mundo.
Esclareceu que o choque que a fez despertar foi um grave acidente ocorrido, 30 anos atrás, numa fábrica de PESTICIDAS – que resultou numa tragédia, com a morte de mais de 35 mil indianos. A partir daí, é que ela acaba se convertendo à causa do povo e não para mais de pesquisar a ação das empresas transnacionais sobre a agricultura.
Hoje, ela é considerada uma das principais pesquisadoras dos malefícios para a saúde humana e para a destruição da biodiversidade que as sementes transgênicas e os agrotóxicos das empresas transnacionais vêm causando em todo o mundo.

“Revolução Verde”
Vandana falou sobre as consequências da chamada Revolução Verde, imposta pelo governo dos Estados Unidos, na década de 1960, a toda a sua área de influência como forma de vender mais insumos agroquímicos e suas mercadorias agrícolas.
O resultado disso – o de subjugar países e camponeses – pode ser visto hoje, já que 65% de toda a biodiversidade e dos recursos de água doce do planeta foram contaminados por agrotóxicos.
Além disso, há estudos comprovando que 40% de todo o efeito estufa que afeta o clima no planeta é causado pelo uso exagerado, desnecessário, de fertilizantes químicos na agricultura.
Afirma Vandana de que em muitas regiões da Europa, em função da mortandade e desaparecimento das abelhas, a produtividade agrícola já teria caído 30%.
A indiana atentou para o fato de que se fôssemos calcular os prejuízos e custos necessários para repor a biodiversidade e reequilibrar o meio ambiente com vistas a amenizar os desequilíbrios climáticos, eles seriam maiores, em dólares, do que todo o comércio de commodities que as empresas realizam.

Genocídio
Em relação à ação das empresas transnacionais que atuam na agricultura – como Monsanto, Bunge, Syngenta e Cargill – também não poupou críticas. Denunciou que elas controlam a produção e o comércio mundial da soja, milho, canola e trigo. E que fazem propaganda enganosa dizendo que a humanidade depende dos alimentos produzidos pelo agronegócio para sobreviver, quando na prática a humanidade se alimenta com centenas de outros vegetais e fontes de proteínas, que elas ainda não puderam controlar.
Disse que essas “empresas, ao promoverem as sementes transgênicas, não inventaram nada de novo. Não desenvolveram nada. O único que fizeram foi fazer mutações genéticas que existem na natureza para viabilizar a venda de seus agrotóxicos”. Citou que a Monsanto conseguiu controlar a produção de algodão na Índia, apoiada por governos subservientes, neoliberais, e que hoje 90% da produção depende de suas sementes e venenos. Com isso houve uma destruição do modo camponês de produzir algodão e um endividamento dos que permaneceram.
A conjunção do alto uso de venenos intoxicantes que levam à depressão e a vergonha da dívida fez com que, desde 1995 até os dias de hoje, houvesse 284 mil suicídios entre os camponeses indianos. Um verdadeiro genocídio escondido pela imprensa mundial e cuja culpada principal seria a Monsanto.
Apesar de tantos sacrifícios humanos, a Monsanto ainda recolhe em seu país 200 milhões de dólares anuais, cobrando royalties pelo uso de sementes geneticamente modificadas de algodão.

Commodities não são alimentos
O modelo do agronegócio é apenas uma forma de se apropriar do lucro dos bens agrícolas, mas ele não resolve os problemas do povo. Tanto é que aumentamos muito a produção, poderíamos inclusive abastecer 12 bilhões de pessoas [quase o dobro da população mundial], mas, no entanto, temos 1 bilhão de pessoas que passam fome todos os dias, sendo 500 milhões delas camponesas que vivem no meio rural e que tiveram seu sistema de produção de alimentos destruído pelo agronegócio.
As commodities agrícolas são meras mercadorias agrícolas, não são alimentos.
Cerca de 70% de todos os alimentos do mundo ainda são produzidos pelos camponeses. É preciso entender que alimentos são a síntese da energia necessária que os seres humanos precisam para sobreviver, a partir do meio ambiente em que vivem, recolhendo essa energia da fertilidade do solo e do meio ambiente.
Quanto maior a biodiversidade da natureza, maior o número de nutrientes e mais sadia será a alimentação produzida naquela região para os humanos. E o agronegócio destrói a biodiversidade e as fontes de energia verdadeiras.
As empresas lançam mão de um fetiche gerado pela propaganda, de que estão usando modernas técnicas de biotecnologia para aumentar a produtividade das plantas, mas isso é um engodo. Quando se vai pesquisar o que são tais biotecnologias, elas são guardadas em segredo. Porque, no fundo, elas não mudam nada na natureza. São apenas mecanismos para aumentar a rentabilidade econômica das grandes plantações.

Na verdade, a agricultura industrial é a padronização do conhecimento, é a negação do conhecimento sobre a arte de cultivar a terra. Porque o verdadeiro conhecimento é desenvolvido pelos próprios agricultores, e pelos pesquisadores, em cada região, em cada bioma, em cada planta.


Consumidores
O modelo do agronegócio quer transformar as pessoas apenas em “consumidores” de suas mercadorias. Vandana nos diz que devemos combater o uso e o reducionismo da expressão “consumidores”, que devemos usar o termo “seres humanos”, pessoas que precisam de uma vida saudável. “Consumidor” indica uma redução subalterna do ser humano.
As empresas do agronegócio dizem que são o desenvolvimento e o progresso. Na prática, chegam a controlar 58% de toda produção agrícola do mundo, porém, dão trabalho para apenas 3% das pessoas que vivem no meio rural. Portanto, o agronegócio é um sistema antissocial.
A indiana revelou ainda que fez parte de um grupo de 300 cientistas de todo mundo que se dedicam a pesquisar a agricultura e que após realizarem diversos estudos, durante três anos, comprovaram que nem a Revolução Verde imposta pelos Estados Unidos, nem o uso intensivo das sementes transgênicas e dos agroquímicos podem resolver os problemas da agricultura e da alimentação mundial. Algo que só pode acontecer por meio da recuperação de práticas agroecológicas que convivam com a biodiversidade, em cada local do planeta.

Vandana concluiu sua crítica ao modelo do agronegócio dizendo que ele projeta a destruição e o medo, porque é concentrador e excludente. Por isso, tornou-se algo comum o costume dessas empresas ameaçarem ou cooptarem os cientistas que se opõe a elas.


A saída é a agroecologia
Após criticar duramente o modelo do capital, a cientista dedicou sua palestra a projetar as técnicas ou o modelo de produção da agroecologia como a alternativa popular e necessária para produção de alimentos.
Defendeu que o modelo da agroecologia é o único que permite desenvolver técnicas de aumentar a produtividade e a produção sem a destruição da biodiversidade.

Afirmou de que a  agroecologia é a única forma de criar empregos e formas de vida saudáveis para a população permanecer no campo e não ter de se marginalizar nas grandes cidades. Sobretudo, fez a defesa de que os métodos da agroecologia são os únicos que conseguem produzir alimentos sadios, sem venenos.


Dificuldades da transição
Quando perguntada sobre as dificuldades da transição entre os dois modelos, contestou, citando a Índia: “Nós já tivemos problemas maiores na época do colonialismo inglês. No entanto, Gandhi nos ensinou que a nossa fortaleza é sempre ‘lutar pela verdade’, porque o capital engana e mente para poder acumular riquezas. Mas a verdade está com a natureza, está com as pessoas”.
Dessa energia que emana de Gandhi, Vandana reforçou: “Se houver vontade política para fazer a mudança, se houver vontade para produzir alimentos sadios, será possível cultivá-los”.

Vandana concluiu conclamando a todos a se envolverem e participarem do Encontro Mundial de Luta Pelos Alimentos Sadios e Contras as Empresas Transnacionais que a Via Campesina, os movimentos de mulheres e centenas de entidades realizam todos os anos, na semana de 16 de outubro. “Precisamos unificar as vozes e as vontades em nível mundial. E essa será uma ótima oportunidade.”


Recomendações
Quando perguntada sobre as recomendações que daria aos jovens, aos estudantes de agronomia, aos agricultores praticantes da agroecologia, Vandana Shiva elencou seis pontos:

Primeiro: disse que a base da agroecologia é a preservação e a valorização dos nutrientes que há no solo. Neste instante, a indiana fez referência a outra cientista presente na plateia que a assistia muito atenta, a professora Ana Maria Primavesi. “Precisamos ir aplicando as técnicas que garantam a saúde do solo, e dessa saúde, recolheremos frutos com energia saudável.”
Segundo: estimular que os agricultores controlem as sementes. As sementes são a garantia da vida. “Nós não podemos permitir que as empresas transnacionais transformem nossas sementes em meras mercadorias. As sementes são um patrimônio da humanidade.”
Terceiro: precisamos relacionar a agroecologia com a produção de alimentos saudáveis que garantam a saúde e assim conquistar os corações e mentes da população da cidade, que está sendo cada vez mais envenenada pelas mercadorias com agrotóxicos. “Se vincularmos os alimentos com a saúde das pessoas, ganharemos milhões de pessoas da cidade para a nossa causa.”
Quarto: precisamos transformar os territórios em que os camponeses têm hegemonia em verdadeiros santuários de sementes, de árvores sadias, de cultivo da biodiversidade, da criação de abelhas, da diversidade agrícola.
Quinto: precisamos defender a ideia que faz parte da democracia, a liberdade das pessoas de terem opções de alimentos. Elas não podem mais serem reféns dos produtos que as empresas colocam nos supermercados de acordo com a sua vontade apenas.
Sexto: precisamos lutar para que os governos parem de usar dinheiro público – que é de todo o povo – para subsidiar, transferir esses recursos para os fazendeiros. Isso vem acontecendo em todo o mundo e também na Índia. O modelo do agronegócio não se sustenta sem os subsídios e vantagens fiscais que os governos lhes garantem.


Ferreira On 11/27/2013 09:22:00 AM 1 comment LEIA MAIS

quarta-feira, 13 de novembro de 2013

     A prática da adubação verde para regenerar a fertilidade do solo é muito antiga, normalmente era o cultivo de uma leguminosa para ser incorporada ao solo na véspera do cultivo principal. No Brasil, esta prática também foi muito utilizada até a década de 70, quando houve uma redução devido ao aumento do uso da adubação química. Porém, logo se verificou que foi um erro acreditar que a adubação química pudesse substituir a adubação orgânica e a adubação verde. Felizmente houve um retorno a estas práticas e hoje elas são consideradas fundamentais para a implantação de uma agricultura sustentável. Com as práticas do plantio direto e cultivo mínimo, o conceito de adubação verde evoluiu, pois ao invés destas plantas serem incorporadas ao solo, elas permanecem sobre o solo, como cobertura morta ou viva, protegendo-o no cultivo seguinte e também são utilizadas outras espécies (aveia, azevém, centeio, nabo forrageiro e outras) além das leguminosas. Onde há pouco esterco de animais é a principal e mais barata fonte de matéria orgânica.
     Os efeitos dos adubos verdes também chamados de “plantas condicionadoras” de solo estão inicialmente associados à capacidade de cobertura do terreno e à adição de matéria orgânica. É preciso ter em mente que as culturas, especialmente as hortaliças, exportam grandes quantidades de nutrientes por meio dos produtos das colheitas (algumas não deixam nada na lavoura), por isso, a adubação orgânica e adubação verde, são essenciais para repor os nutrientes, caso contrário, ocorrerá um processo gradual de empobrecimento do solo. Dentre os principais benefícios dos adubos verdes, destacam-se:

         ● Proteção contra a erosão;
         Melhoria da estrutura, com aumento na infiltração e retenção de água no solo;
         ● Ciclagem de nutrientes;
         ● Redução da população de plantas espontâneas;
       Contribuição para o equilíbrio biológico do solo, podendo favorecer a população de organismos benéficos e reduzir problemas ligados a patógenos do solo, entre outros.

     O uso dos adubos verdes pode ser feito tanto em áreas em que se fez o preparo do solo como em áreas cobertas por palhadas ou restos culturais. A forma de manejo depende da finalidade da adubação verde.

Incorporados ao solo:  esta é a forma antiga de manejo dos adubos verdes, quando o objetivo principal é o fornecimento de nutrientes para a cultura seguinte, devido a decomposição rápida.
Mantidos na superfície do solo: esta é a forma moderna de manejo de adubos verdes, visando-se a proteção do solo contra erosão e plantas espontâneas (decomposição lenta), a produção de palhada (cobertura morta ou viva) para o plantio direto ou cultivo mínimo, a reciclagem de nutrientes, o aumento da infiltração e retenção de água no solo e, favorecimento da população de organismos benéficos e inimigos naturais dos insetos-pragas.
Acamamento: é a prática mais recomendada para realização de plantio direto e cultivo mínimo de hortaliças ou grãos e também nos pomares. O acamamento pode ser feito com equipamentos simples como o rolo-faca e outros;
Roçada: Esta prática é usada quando não se consegue fazer o acamamento ou então quando os adubos verdes em consorciação estão competindo especialmente por luz. Quando é preciso fazer canteiros e a produção de massa verde é muito grande deve-se roçar para ficar mais fácil para incorporar a adubação verde. Para cultivo de cenoura, por exemplo, deve-se incorporar a adubação verde superficial (10 a 15 cm de profundidade) com antecedência de 3 semanas antes da semeadura ou transplante (outras hortaliças) para dar tempo para a decomposição do material. Quando for feito o preparo do solo é muito importante tomar cuidado com o uso de enxadas rotativas, especialmente microtratores, pois movimenta excessivamente o solo, desestruturando-o e compactando-o. Por isso, sempre que possível deve-se dar preferência para o plantio direto e cultivo mínimo, tanto para culturas anuais como perenes.
Os adubos verdes também chamadas de “plantas de cobertura” exercem importante papel na conservação do solo, no suprimento de nutrientes como o nitrogênio, no equilíbrio das propriedades do solo e no manejo de plantas espontâneas. As plantas de cobertura afetam diretamente a germinação das sementes e o crescimento das plantas espontâneas, podendo, quando a cobertura do solo estiver acima de 90%, reduzir o número de plantas espontâneas em até 75%.
As plantas de cobertura do solo, tradicionalmente, têm sido utilizadas para conservação do solo e suprimento de nitrogênio através das leguminosas. Atualmente, essas plantas têm despertado interesse também no manejo de plantas espontâneas. Áreas infestadas por tiririca ou junca (Cyperus rotundus), planta indicadora de solo ácido, compactado e com carência em magnésio (Mg) podem ser melhoradas com o cultivo de plantas de cobertura, tais como feijão-de-porco e mucuna-preta. Especificamente para o manejo de plantas espontâneas, não existe uma espécie ideal. Cada espécie se adapta a determinado sistema de manejo. No entanto, existem alguns critérios básicos, relacionados a seguir, que devem ser levados em consideração quando da escolha da espécie.

Critérios na escolha de plantas para adubação verde
     Todas as espécies apresentam vantagens e desvantagens, desenvolvendo-se bem dentro de certas condições climáticas e práticas de cultivo e de manejo, por isso, alguns critérios devem ser observados na escolha da espécie de adubação verde e cobertura do solo.

● Apresentação de rápido crescimento inicial e eficiente cobertura do solo;
● Sistema radicular profundo e diferenciado das culturas;   
● Produção de elevada quantidade de massa verde e massa seca, proporcionando adequada cobertura do solo pela palha;                                                                                                        ● Apresentação de lenta decomposição da palha;
● Facilidade de implantação e condução no campo;
● Resistência às pragas e doenças, não se comportando como planta hospedeira;
Fácil manejo (acamamento) das espécies para implantação dos cultivos de sucessão;
     ● Ausência de comportamento como invasoras, dificultando o cultivo de culturas de sucessão
● Rusticidade: desenvolvimento mesmo em situações de estresse (pouca água, frio e calor).
● Promoção de associações com fungos e bactérias na fixação de nitrogênio e liberação de fósforo;
● Possibilidade de ser multiplicadas por sementes;
● Plantas que permitam outros usos além da adubação verde, como para alimentação humana, animal, artesanato e outros.
● Plantas que são facilmente manejadas mecanicamente, por meio de roçada ou rolo-faca.
Cabe ressaltar que a importância de cada uma das características desejáveis relacionadas anteriormente, depende do sistema de cultivo a ser adotado (rotação de culturas, consórcio, etc.) e da cultura de interesse econômico.

Rotação e consórcio de adubos verdes
Com o objetivo de melhorar a cobertura do solo, promover o efeito benéfico no manejo de plantas espontâneas e aprimorar a eficiência na ciclagem de nutrientes, a rotação e a mistura de espécies feita por meio do consórcio de adubos verdes é prática de grande utilidade para o cultivo de qualquer cultura. Seguramente um dos maiores ganhos dessa técnica é a maior produção de massa, podendo em alguns casos ser quatro vezes maior do que o cultivo solteiro.
No cultivo de hortaliças também a prática da adubação verde através da rotação e consorciação é importante e perfeitamente possível de ser adotada anualmente. Independentemente da espécie de hortaliça, a adubação verde quase sempre proporciona algum tipo de benefício no manejo orgânico, seja diretamente para a cultura econômica ou, indiretamente, por meio da melhoria das condições de solo. O uso de adubos verdes através da rotação de culturas é favorável para qualquer espécie de hortaliça, enquanto  que no cultivo consorciado (hortaliças + adubos verdes) as espécies com maior espaçamento de plantio entre linhas (ex.: tomate, pimentão, milho-verde, aipim, repolho, couve-flor, brócolis, couve e outras) são as mais beneficiadas.
No cultivo em rotação, o adubo verde pode ser incorporado ao solo após a roçada para posterior plantio da hortaliça, ou mantido em cobertura sobre a superfície do terreno, fazendo-se o plantio direto da hortaliça na palhada. A manutenção da palhada na superfície retarda a germinação das sementes de plantas espontâneas, ao passo que a sua incorporação ao solo tende a fornecer os nutrientes mais rapidamente para a cultura em sucessão. Quando os adubos verdes são cultivados em rotação com hortaliças recomenda-se a roçada no momento de seu máximo desenvolvimento, ou seja, quando ocorre alta acumulação de nutrientes na massa vegetal; para as leguminosas a roçada pode ser feita na ocasião do florescimento, enquanto que para as gramíneas, a roçada deve ser feita na fase de grão leitoso.
Existem várias sugestões de consórcios de adubos verdes com hortaliças que podem ser adotadas, mas todas precisam ser ajustadas na propriedade. No consórcio, o adubo verde pode ser semeado nas  entrelinhas ou formando faixas intercalares com as hortaliças, quando as espécies de adubos verdes apresentam porte arbustivo ou arbóreo. Quando a adubação verde é utilizada em consórcio com hortaliças, é importante que a roçada ou a poda sejam feitas no momento em que o adubo verde tenha criado condições desfavoráveis ao bom desenvolvimento da cultura econômica, em decorrência da competição por água e luz.
  
Uso de adubos verdes (coquetel e consórcios) na produção orgânica de hortaliças:  O “coquetel” consiste no cultivo consorciado de diferentes espécies de adubos verdes que, de maneira geral, apresentam portes e hábitos de crescimento distintos e são cultivados em rotação e em consórcio com as culturas econômicas. Sempre que possível, sugere-se o consórcio de leguminosas (ex.: ervilhaca, feijão-de-porco e mucuna) e gramíneas (ex.: aveia, milho) e outras como o nabo forrageiro. Esta estratégia permite que as gramíneas que possuem decomposição mais lenta, forneçam uma cobertura residual mais estável, desfavorecendo as plantas espontâneas, enquanto que as leguminosas contribuem com um aporte maior de N e decomposição mais rápida. Por outro lado o nabo forrageiro, devido ao sistema radicular pivotante, contribui com uma melhor descompactação do solo. A combinação de mais de uma espécie de adubo verde pode trazer outros benefícios para o cultivo das culturas, tais como:

. Exploração de camadas diferenciadas do solo pelas raízes, melhorando a estrutura do solo e acumulando diferentes nutrientes;
. Velocidade distinta de decomposição dos resíduos com impacto na proteção do solo, manejo de plantas espontâneas e liberação de nutrientes;
. Aumento da diversidade biológica, tão importante para o equilíbrio ecológico, proporcionando impacto sobre a população de insetos benéficos pela oferta variada de abrigo, de néctar e de pólen.

Que hortaliças e adubos verdes podem ser consorciados? a maioria das hortaliças pode ser cultivada com adubos verdes. Existem diferentes estratégias que podem ser adotadas, sendo algumas já conhecidas e outras que precisam ser testadas e ajustadas na propriedade. O manejo dos adubos verdes através da rotação é favorável para qualquer tipo de hortaliças, enquanto que no consorciado são favorecidas as hortaliças de maior espaçamento entre linhas (Figuras 1,2 e 3), tais como as hortaliças-frutos (tomate, pimentão, berinjela e milho-verde) e as espécies da família botânica das brássicas (repolho, couve-flor, brócolis e couve). Dentre os adubos verdes, podem ser utilizados as crotalárias, feijão-de-porco, amendoim forrageiro, aveia, ervilhaca, nabo forrageiro e mucuna anã, em consorciação com as hortaliças. Outra estratégia de adubação verde consiste no plantio do adubo verde quando o ciclo da cultura principal está se completando; um exemplo consiste de hortaliças folhosas, como alface, consorciada com Crotalaria juncea semeada no terço final do ciclo desta espécie. Trabalhos de pesquisa comprovam que o plantio da mucuna em consórcio com o milho após 75 dias do plantio deste, não interferem na produtividade do milho e nem atrapalham a sua colheita podendo esta ser mecanizada. Por outro lado, o plantio do milho visando a colheita de milho-verde, pode ser feito simultaneamente com o plantio de mucuna na linha de plantio do milho.
Figura 1. Cultivo mínimo de tomate e milho-verde no final do inverno  em solo coberto com adubos verdes (aveia – 60 kg/ha + ervilhaca – 18 kg/ha + nabo forrageiro –  4 kg/ha), semeados no outono, na Epagri/Estação Experimental de Urussanga, SC.




Figura 2. Cultivo mínimo de brássicas (repolho, couve-flor e brócolis) no final de inverno, plantados sobre cobertura de adubos verdes (aveia+ervilhaca+nabo forrageiro), semeados no outono, na Epagri/Estação Experimental de Urussanga, SC.


Figura 3. Cultivo mínimo de repolho no final de inverno, plantado sobre cobertura de adubos verdes (aveia+ervilhaca+nabo forrageiro), semeados no outono, na Epagri/Estação Experimental de Urussanga, SC. 
Ferreira On 11/13/2013 01:13:00 AM 4 comments LEIA MAIS

quarta-feira, 27 de novembro de 2013

Agronegócio, um modelo esgotado

Reportagem  de Péricles de Oliveira, publicada no jornal Brasil de Fato em 06-08-2013. 

Perante uma atenta plateia composta por mais de 3 mil pessoas, a renomada cientista indiana Vandana Shiva (foto) fez uma palestra de uma hora, respondeu a perguntas e encantou a todos com suas ideias, experiências e convicções, durante a abertura do III Encontro Internacional de Agroecologia, no dia 31 de julho, na cidade de Botucatu, interior de São Paulo.





Vandana foi muito contundente ao longo de toda a sua fala. Começou contando de sua vida, de como havia estudado biologia e física quântica na universidade e de como se considerava uma pessoa alienada da realidade do mundo.
Esclareceu que o choque que a fez despertar foi um grave acidente ocorrido, 30 anos atrás, numa fábrica de PESTICIDAS – que resultou numa tragédia, com a morte de mais de 35 mil indianos. A partir daí, é que ela acaba se convertendo à causa do povo e não para mais de pesquisar a ação das empresas transnacionais sobre a agricultura.
Hoje, ela é considerada uma das principais pesquisadoras dos malefícios para a saúde humana e para a destruição da biodiversidade que as sementes transgênicas e os agrotóxicos das empresas transnacionais vêm causando em todo o mundo.

“Revolução Verde”
Vandana falou sobre as consequências da chamada Revolução Verde, imposta pelo governo dos Estados Unidos, na década de 1960, a toda a sua área de influência como forma de vender mais insumos agroquímicos e suas mercadorias agrícolas.
O resultado disso – o de subjugar países e camponeses – pode ser visto hoje, já que 65% de toda a biodiversidade e dos recursos de água doce do planeta foram contaminados por agrotóxicos.
Além disso, há estudos comprovando que 40% de todo o efeito estufa que afeta o clima no planeta é causado pelo uso exagerado, desnecessário, de fertilizantes químicos na agricultura.
Afirma Vandana de que em muitas regiões da Europa, em função da mortandade e desaparecimento das abelhas, a produtividade agrícola já teria caído 30%.
A indiana atentou para o fato de que se fôssemos calcular os prejuízos e custos necessários para repor a biodiversidade e reequilibrar o meio ambiente com vistas a amenizar os desequilíbrios climáticos, eles seriam maiores, em dólares, do que todo o comércio de commodities que as empresas realizam.

Genocídio
Em relação à ação das empresas transnacionais que atuam na agricultura – como Monsanto, Bunge, Syngenta e Cargill – também não poupou críticas. Denunciou que elas controlam a produção e o comércio mundial da soja, milho, canola e trigo. E que fazem propaganda enganosa dizendo que a humanidade depende dos alimentos produzidos pelo agronegócio para sobreviver, quando na prática a humanidade se alimenta com centenas de outros vegetais e fontes de proteínas, que elas ainda não puderam controlar.
Disse que essas “empresas, ao promoverem as sementes transgênicas, não inventaram nada de novo. Não desenvolveram nada. O único que fizeram foi fazer mutações genéticas que existem na natureza para viabilizar a venda de seus agrotóxicos”. Citou que a Monsanto conseguiu controlar a produção de algodão na Índia, apoiada por governos subservientes, neoliberais, e que hoje 90% da produção depende de suas sementes e venenos. Com isso houve uma destruição do modo camponês de produzir algodão e um endividamento dos que permaneceram.
A conjunção do alto uso de venenos intoxicantes que levam à depressão e a vergonha da dívida fez com que, desde 1995 até os dias de hoje, houvesse 284 mil suicídios entre os camponeses indianos. Um verdadeiro genocídio escondido pela imprensa mundial e cuja culpada principal seria a Monsanto.
Apesar de tantos sacrifícios humanos, a Monsanto ainda recolhe em seu país 200 milhões de dólares anuais, cobrando royalties pelo uso de sementes geneticamente modificadas de algodão.

Commodities não são alimentos
O modelo do agronegócio é apenas uma forma de se apropriar do lucro dos bens agrícolas, mas ele não resolve os problemas do povo. Tanto é que aumentamos muito a produção, poderíamos inclusive abastecer 12 bilhões de pessoas [quase o dobro da população mundial], mas, no entanto, temos 1 bilhão de pessoas que passam fome todos os dias, sendo 500 milhões delas camponesas que vivem no meio rural e que tiveram seu sistema de produção de alimentos destruído pelo agronegócio.
As commodities agrícolas são meras mercadorias agrícolas, não são alimentos.
Cerca de 70% de todos os alimentos do mundo ainda são produzidos pelos camponeses. É preciso entender que alimentos são a síntese da energia necessária que os seres humanos precisam para sobreviver, a partir do meio ambiente em que vivem, recolhendo essa energia da fertilidade do solo e do meio ambiente.
Quanto maior a biodiversidade da natureza, maior o número de nutrientes e mais sadia será a alimentação produzida naquela região para os humanos. E o agronegócio destrói a biodiversidade e as fontes de energia verdadeiras.
As empresas lançam mão de um fetiche gerado pela propaganda, de que estão usando modernas técnicas de biotecnologia para aumentar a produtividade das plantas, mas isso é um engodo. Quando se vai pesquisar o que são tais biotecnologias, elas são guardadas em segredo. Porque, no fundo, elas não mudam nada na natureza. São apenas mecanismos para aumentar a rentabilidade econômica das grandes plantações.

Na verdade, a agricultura industrial é a padronização do conhecimento, é a negação do conhecimento sobre a arte de cultivar a terra. Porque o verdadeiro conhecimento é desenvolvido pelos próprios agricultores, e pelos pesquisadores, em cada região, em cada bioma, em cada planta.


Consumidores
O modelo do agronegócio quer transformar as pessoas apenas em “consumidores” de suas mercadorias. Vandana nos diz que devemos combater o uso e o reducionismo da expressão “consumidores”, que devemos usar o termo “seres humanos”, pessoas que precisam de uma vida saudável. “Consumidor” indica uma redução subalterna do ser humano.
As empresas do agronegócio dizem que são o desenvolvimento e o progresso. Na prática, chegam a controlar 58% de toda produção agrícola do mundo, porém, dão trabalho para apenas 3% das pessoas que vivem no meio rural. Portanto, o agronegócio é um sistema antissocial.
A indiana revelou ainda que fez parte de um grupo de 300 cientistas de todo mundo que se dedicam a pesquisar a agricultura e que após realizarem diversos estudos, durante três anos, comprovaram que nem a Revolução Verde imposta pelos Estados Unidos, nem o uso intensivo das sementes transgênicas e dos agroquímicos podem resolver os problemas da agricultura e da alimentação mundial. Algo que só pode acontecer por meio da recuperação de práticas agroecológicas que convivam com a biodiversidade, em cada local do planeta.

Vandana concluiu sua crítica ao modelo do agronegócio dizendo que ele projeta a destruição e o medo, porque é concentrador e excludente. Por isso, tornou-se algo comum o costume dessas empresas ameaçarem ou cooptarem os cientistas que se opõe a elas.


A saída é a agroecologia
Após criticar duramente o modelo do capital, a cientista dedicou sua palestra a projetar as técnicas ou o modelo de produção da agroecologia como a alternativa popular e necessária para produção de alimentos.
Defendeu que o modelo da agroecologia é o único que permite desenvolver técnicas de aumentar a produtividade e a produção sem a destruição da biodiversidade.

Afirmou de que a  agroecologia é a única forma de criar empregos e formas de vida saudáveis para a população permanecer no campo e não ter de se marginalizar nas grandes cidades. Sobretudo, fez a defesa de que os métodos da agroecologia são os únicos que conseguem produzir alimentos sadios, sem venenos.


Dificuldades da transição
Quando perguntada sobre as dificuldades da transição entre os dois modelos, contestou, citando a Índia: “Nós já tivemos problemas maiores na época do colonialismo inglês. No entanto, Gandhi nos ensinou que a nossa fortaleza é sempre ‘lutar pela verdade’, porque o capital engana e mente para poder acumular riquezas. Mas a verdade está com a natureza, está com as pessoas”.
Dessa energia que emana de Gandhi, Vandana reforçou: “Se houver vontade política para fazer a mudança, se houver vontade para produzir alimentos sadios, será possível cultivá-los”.

Vandana concluiu conclamando a todos a se envolverem e participarem do Encontro Mundial de Luta Pelos Alimentos Sadios e Contras as Empresas Transnacionais que a Via Campesina, os movimentos de mulheres e centenas de entidades realizam todos os anos, na semana de 16 de outubro. “Precisamos unificar as vozes e as vontades em nível mundial. E essa será uma ótima oportunidade.”


Recomendações
Quando perguntada sobre as recomendações que daria aos jovens, aos estudantes de agronomia, aos agricultores praticantes da agroecologia, Vandana Shiva elencou seis pontos:

Primeiro: disse que a base da agroecologia é a preservação e a valorização dos nutrientes que há no solo. Neste instante, a indiana fez referência a outra cientista presente na plateia que a assistia muito atenta, a professora Ana Maria Primavesi. “Precisamos ir aplicando as técnicas que garantam a saúde do solo, e dessa saúde, recolheremos frutos com energia saudável.”
Segundo: estimular que os agricultores controlem as sementes. As sementes são a garantia da vida. “Nós não podemos permitir que as empresas transnacionais transformem nossas sementes em meras mercadorias. As sementes são um patrimônio da humanidade.”
Terceiro: precisamos relacionar a agroecologia com a produção de alimentos saudáveis que garantam a saúde e assim conquistar os corações e mentes da população da cidade, que está sendo cada vez mais envenenada pelas mercadorias com agrotóxicos. “Se vincularmos os alimentos com a saúde das pessoas, ganharemos milhões de pessoas da cidade para a nossa causa.”
Quarto: precisamos transformar os territórios em que os camponeses têm hegemonia em verdadeiros santuários de sementes, de árvores sadias, de cultivo da biodiversidade, da criação de abelhas, da diversidade agrícola.
Quinto: precisamos defender a ideia que faz parte da democracia, a liberdade das pessoas de terem opções de alimentos. Elas não podem mais serem reféns dos produtos que as empresas colocam nos supermercados de acordo com a sua vontade apenas.
Sexto: precisamos lutar para que os governos parem de usar dinheiro público – que é de todo o povo – para subsidiar, transferir esses recursos para os fazendeiros. Isso vem acontecendo em todo o mundo e também na Índia. O modelo do agronegócio não se sustenta sem os subsídios e vantagens fiscais que os governos lhes garantem.


quarta-feira, 13 de novembro de 2013

Adubação verde: Manejo e importância na produção orgânica de hortaliças

     A prática da adubação verde para regenerar a fertilidade do solo é muito antiga, normalmente era o cultivo de uma leguminosa para ser incorporada ao solo na véspera do cultivo principal. No Brasil, esta prática também foi muito utilizada até a década de 70, quando houve uma redução devido ao aumento do uso da adubação química. Porém, logo se verificou que foi um erro acreditar que a adubação química pudesse substituir a adubação orgânica e a adubação verde. Felizmente houve um retorno a estas práticas e hoje elas são consideradas fundamentais para a implantação de uma agricultura sustentável. Com as práticas do plantio direto e cultivo mínimo, o conceito de adubação verde evoluiu, pois ao invés destas plantas serem incorporadas ao solo, elas permanecem sobre o solo, como cobertura morta ou viva, protegendo-o no cultivo seguinte e também são utilizadas outras espécies (aveia, azevém, centeio, nabo forrageiro e outras) além das leguminosas. Onde há pouco esterco de animais é a principal e mais barata fonte de matéria orgânica.
     Os efeitos dos adubos verdes também chamados de “plantas condicionadoras” de solo estão inicialmente associados à capacidade de cobertura do terreno e à adição de matéria orgânica. É preciso ter em mente que as culturas, especialmente as hortaliças, exportam grandes quantidades de nutrientes por meio dos produtos das colheitas (algumas não deixam nada na lavoura), por isso, a adubação orgânica e adubação verde, são essenciais para repor os nutrientes, caso contrário, ocorrerá um processo gradual de empobrecimento do solo. Dentre os principais benefícios dos adubos verdes, destacam-se:

         ● Proteção contra a erosão;
         Melhoria da estrutura, com aumento na infiltração e retenção de água no solo;
         ● Ciclagem de nutrientes;
         ● Redução da população de plantas espontâneas;
       Contribuição para o equilíbrio biológico do solo, podendo favorecer a população de organismos benéficos e reduzir problemas ligados a patógenos do solo, entre outros.

     O uso dos adubos verdes pode ser feito tanto em áreas em que se fez o preparo do solo como em áreas cobertas por palhadas ou restos culturais. A forma de manejo depende da finalidade da adubação verde.

Incorporados ao solo:  esta é a forma antiga de manejo dos adubos verdes, quando o objetivo principal é o fornecimento de nutrientes para a cultura seguinte, devido a decomposição rápida.
Mantidos na superfície do solo: esta é a forma moderna de manejo de adubos verdes, visando-se a proteção do solo contra erosão e plantas espontâneas (decomposição lenta), a produção de palhada (cobertura morta ou viva) para o plantio direto ou cultivo mínimo, a reciclagem de nutrientes, o aumento da infiltração e retenção de água no solo e, favorecimento da população de organismos benéficos e inimigos naturais dos insetos-pragas.
Acamamento: é a prática mais recomendada para realização de plantio direto e cultivo mínimo de hortaliças ou grãos e também nos pomares. O acamamento pode ser feito com equipamentos simples como o rolo-faca e outros;
Roçada: Esta prática é usada quando não se consegue fazer o acamamento ou então quando os adubos verdes em consorciação estão competindo especialmente por luz. Quando é preciso fazer canteiros e a produção de massa verde é muito grande deve-se roçar para ficar mais fácil para incorporar a adubação verde. Para cultivo de cenoura, por exemplo, deve-se incorporar a adubação verde superficial (10 a 15 cm de profundidade) com antecedência de 3 semanas antes da semeadura ou transplante (outras hortaliças) para dar tempo para a decomposição do material. Quando for feito o preparo do solo é muito importante tomar cuidado com o uso de enxadas rotativas, especialmente microtratores, pois movimenta excessivamente o solo, desestruturando-o e compactando-o. Por isso, sempre que possível deve-se dar preferência para o plantio direto e cultivo mínimo, tanto para culturas anuais como perenes.
Os adubos verdes também chamadas de “plantas de cobertura” exercem importante papel na conservação do solo, no suprimento de nutrientes como o nitrogênio, no equilíbrio das propriedades do solo e no manejo de plantas espontâneas. As plantas de cobertura afetam diretamente a germinação das sementes e o crescimento das plantas espontâneas, podendo, quando a cobertura do solo estiver acima de 90%, reduzir o número de plantas espontâneas em até 75%.
As plantas de cobertura do solo, tradicionalmente, têm sido utilizadas para conservação do solo e suprimento de nitrogênio através das leguminosas. Atualmente, essas plantas têm despertado interesse também no manejo de plantas espontâneas. Áreas infestadas por tiririca ou junca (Cyperus rotundus), planta indicadora de solo ácido, compactado e com carência em magnésio (Mg) podem ser melhoradas com o cultivo de plantas de cobertura, tais como feijão-de-porco e mucuna-preta. Especificamente para o manejo de plantas espontâneas, não existe uma espécie ideal. Cada espécie se adapta a determinado sistema de manejo. No entanto, existem alguns critérios básicos, relacionados a seguir, que devem ser levados em consideração quando da escolha da espécie.

Critérios na escolha de plantas para adubação verde
     Todas as espécies apresentam vantagens e desvantagens, desenvolvendo-se bem dentro de certas condições climáticas e práticas de cultivo e de manejo, por isso, alguns critérios devem ser observados na escolha da espécie de adubação verde e cobertura do solo.

● Apresentação de rápido crescimento inicial e eficiente cobertura do solo;
● Sistema radicular profundo e diferenciado das culturas;   
● Produção de elevada quantidade de massa verde e massa seca, proporcionando adequada cobertura do solo pela palha;                                                                                                        ● Apresentação de lenta decomposição da palha;
● Facilidade de implantação e condução no campo;
● Resistência às pragas e doenças, não se comportando como planta hospedeira;
Fácil manejo (acamamento) das espécies para implantação dos cultivos de sucessão;
     ● Ausência de comportamento como invasoras, dificultando o cultivo de culturas de sucessão
● Rusticidade: desenvolvimento mesmo em situações de estresse (pouca água, frio e calor).
● Promoção de associações com fungos e bactérias na fixação de nitrogênio e liberação de fósforo;
● Possibilidade de ser multiplicadas por sementes;
● Plantas que permitam outros usos além da adubação verde, como para alimentação humana, animal, artesanato e outros.
● Plantas que são facilmente manejadas mecanicamente, por meio de roçada ou rolo-faca.
Cabe ressaltar que a importância de cada uma das características desejáveis relacionadas anteriormente, depende do sistema de cultivo a ser adotado (rotação de culturas, consórcio, etc.) e da cultura de interesse econômico.

Rotação e consórcio de adubos verdes
Com o objetivo de melhorar a cobertura do solo, promover o efeito benéfico no manejo de plantas espontâneas e aprimorar a eficiência na ciclagem de nutrientes, a rotação e a mistura de espécies feita por meio do consórcio de adubos verdes é prática de grande utilidade para o cultivo de qualquer cultura. Seguramente um dos maiores ganhos dessa técnica é a maior produção de massa, podendo em alguns casos ser quatro vezes maior do que o cultivo solteiro.
No cultivo de hortaliças também a prática da adubação verde através da rotação e consorciação é importante e perfeitamente possível de ser adotada anualmente. Independentemente da espécie de hortaliça, a adubação verde quase sempre proporciona algum tipo de benefício no manejo orgânico, seja diretamente para a cultura econômica ou, indiretamente, por meio da melhoria das condições de solo. O uso de adubos verdes através da rotação de culturas é favorável para qualquer espécie de hortaliça, enquanto  que no cultivo consorciado (hortaliças + adubos verdes) as espécies com maior espaçamento de plantio entre linhas (ex.: tomate, pimentão, milho-verde, aipim, repolho, couve-flor, brócolis, couve e outras) são as mais beneficiadas.
No cultivo em rotação, o adubo verde pode ser incorporado ao solo após a roçada para posterior plantio da hortaliça, ou mantido em cobertura sobre a superfície do terreno, fazendo-se o plantio direto da hortaliça na palhada. A manutenção da palhada na superfície retarda a germinação das sementes de plantas espontâneas, ao passo que a sua incorporação ao solo tende a fornecer os nutrientes mais rapidamente para a cultura em sucessão. Quando os adubos verdes são cultivados em rotação com hortaliças recomenda-se a roçada no momento de seu máximo desenvolvimento, ou seja, quando ocorre alta acumulação de nutrientes na massa vegetal; para as leguminosas a roçada pode ser feita na ocasião do florescimento, enquanto que para as gramíneas, a roçada deve ser feita na fase de grão leitoso.
Existem várias sugestões de consórcios de adubos verdes com hortaliças que podem ser adotadas, mas todas precisam ser ajustadas na propriedade. No consórcio, o adubo verde pode ser semeado nas  entrelinhas ou formando faixas intercalares com as hortaliças, quando as espécies de adubos verdes apresentam porte arbustivo ou arbóreo. Quando a adubação verde é utilizada em consórcio com hortaliças, é importante que a roçada ou a poda sejam feitas no momento em que o adubo verde tenha criado condições desfavoráveis ao bom desenvolvimento da cultura econômica, em decorrência da competição por água e luz.
  
Uso de adubos verdes (coquetel e consórcios) na produção orgânica de hortaliças:  O “coquetel” consiste no cultivo consorciado de diferentes espécies de adubos verdes que, de maneira geral, apresentam portes e hábitos de crescimento distintos e são cultivados em rotação e em consórcio com as culturas econômicas. Sempre que possível, sugere-se o consórcio de leguminosas (ex.: ervilhaca, feijão-de-porco e mucuna) e gramíneas (ex.: aveia, milho) e outras como o nabo forrageiro. Esta estratégia permite que as gramíneas que possuem decomposição mais lenta, forneçam uma cobertura residual mais estável, desfavorecendo as plantas espontâneas, enquanto que as leguminosas contribuem com um aporte maior de N e decomposição mais rápida. Por outro lado o nabo forrageiro, devido ao sistema radicular pivotante, contribui com uma melhor descompactação do solo. A combinação de mais de uma espécie de adubo verde pode trazer outros benefícios para o cultivo das culturas, tais como:

. Exploração de camadas diferenciadas do solo pelas raízes, melhorando a estrutura do solo e acumulando diferentes nutrientes;
. Velocidade distinta de decomposição dos resíduos com impacto na proteção do solo, manejo de plantas espontâneas e liberação de nutrientes;
. Aumento da diversidade biológica, tão importante para o equilíbrio ecológico, proporcionando impacto sobre a população de insetos benéficos pela oferta variada de abrigo, de néctar e de pólen.

Que hortaliças e adubos verdes podem ser consorciados? a maioria das hortaliças pode ser cultivada com adubos verdes. Existem diferentes estratégias que podem ser adotadas, sendo algumas já conhecidas e outras que precisam ser testadas e ajustadas na propriedade. O manejo dos adubos verdes através da rotação é favorável para qualquer tipo de hortaliças, enquanto que no consorciado são favorecidas as hortaliças de maior espaçamento entre linhas (Figuras 1,2 e 3), tais como as hortaliças-frutos (tomate, pimentão, berinjela e milho-verde) e as espécies da família botânica das brássicas (repolho, couve-flor, brócolis e couve). Dentre os adubos verdes, podem ser utilizados as crotalárias, feijão-de-porco, amendoim forrageiro, aveia, ervilhaca, nabo forrageiro e mucuna anã, em consorciação com as hortaliças. Outra estratégia de adubação verde consiste no plantio do adubo verde quando o ciclo da cultura principal está se completando; um exemplo consiste de hortaliças folhosas, como alface, consorciada com Crotalaria juncea semeada no terço final do ciclo desta espécie. Trabalhos de pesquisa comprovam que o plantio da mucuna em consórcio com o milho após 75 dias do plantio deste, não interferem na produtividade do milho e nem atrapalham a sua colheita podendo esta ser mecanizada. Por outro lado, o plantio do milho visando a colheita de milho-verde, pode ser feito simultaneamente com o plantio de mucuna na linha de plantio do milho.
Figura 1. Cultivo mínimo de tomate e milho-verde no final do inverno  em solo coberto com adubos verdes (aveia – 60 kg/ha + ervilhaca – 18 kg/ha + nabo forrageiro –  4 kg/ha), semeados no outono, na Epagri/Estação Experimental de Urussanga, SC.




Figura 2. Cultivo mínimo de brássicas (repolho, couve-flor e brócolis) no final de inverno, plantados sobre cobertura de adubos verdes (aveia+ervilhaca+nabo forrageiro), semeados no outono, na Epagri/Estação Experimental de Urussanga, SC.


Figura 3. Cultivo mínimo de repolho no final de inverno, plantado sobre cobertura de adubos verdes (aveia+ervilhaca+nabo forrageiro), semeados no outono, na Epagri/Estação Experimental de Urussanga, SC. 
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