quarta-feira, 28 de novembro de 2018


Autores: Érika Alexandra Sandra Gomes Oliveira Araújo 1; Silvia Dias                                   Costa  Fernandes 2; Francisco Roque 3; Marina Neves Delgado 4

1Graduação Tecnólogo em Agroecologia, Instituto Federal de Brasília, Campus      Planaltina E-   mail:  erikaediana@gmail.com
2Professora pesquisadora, Instituto Federal de Brasília, Campus Planaltina. E-    mail: silvia.fernandes@ifb.edu.br
3Professor pesquisador, Instituto Federal de Brasília, Campus Recanto das       Emas. E-mail: francisco.roque@ifb.edu.br
     4Professora pesquisadora, Instituto Federal de Brasília, Campus Planaltina. E-             mail: marina.delgado@etfbsb.edu.br

Fonte: Revista Brasileira de Agroecologia,  v.13, n.4, p.163-174, 2018.                              



RESUMO
O manejo de pragas com o uso de importante prática para se evitar perdas na produção agrícola. Nesse sentido, objetivou-se conhecer as plantas fitossanitárias usadas pelos agricultores familiares de Planaltina (DF), assim como determinar a mais utilizada, o tipo de cultura mais suscetível e o tipo de parasita mais combatido. Foram realizadas trinta entrevistas semiestruturadas no Núcleo Rural Santos Dumont. Shapiro-Wilk e Kruskal-Wallis foram estimados para a normalidade e distribuição das médias, respectivamente. O aprendizado dos agricultores sobre plantas fitossanitárias foi, principalmente, geracional. Porém, foi constado que esse conhecimento depende do interesse específico do produtor. Os agricultores citaram 22 espécies, sendo o fumo a mais relatada (H = 61,76; p <0,01). Plantas hortícolas foram as mais suscetíveis a pragas (H = 46,22; p < 0,01) e os principais problemas foram com insetos folívoros, sobretudo mastigadores (H = 49,04; p < 0,01). Constatou-se conhecimento dos agricultores para manejo de pragas sem o uso de agrotóxicos. No entanto, o uso de fumo necessita de melhor controle, pois sua toxicidade é alta para as pessoas.

Palavras-chave: Agricultura sustentável, Fumo, Insetos Folívoros, Plantas Hortícolas.

ABSTRACT

Pest management using phytosanitary plants is an important practice to avoid losses in agricultural production. In this regard, we aimed to know the phytosanitary plants used by the family farmers of Planaltina (DF) as well as to determine the most used phytosanitary plant, the most susceptible crop and the most combatted type of parasite. Thirty semi-structured interviews were conducted at Núcleo Rural Santos Dumont. Shapiro-Wilk and Kruskal-Wallis were estimated for the normality and distribution of the means, respectively. The farmers' learning about phytosanitary plants was mainly generational. Although, it was stated that this knowledge depends on the specific interest of the producer. The farmers cited 22 species, the most reported being tobacco (H = 61.76, p <0.01). Horticultural plants were the most susceptible to pests (H = 46.22, p <0.01) and the main problems were with folivores insects, mainly chewers (H = 49.04, p <0.01). It was determined the farmers' knowledge of pest management without the use of agrochemicals. However, the use of tabacco needs better control because its toxicity is high for people.

Keywords: Sustainable Agriculture, Tabacco, Folivores Insects, Horticultural Plants.




Organismos que invadem plantações são considerados pragas quando reduzem a produção de determinadas culturas, podendo ocasionar prejuízos econômicos ao agricultor (PICANÇO e GUEDES, 1999). Por isso, necessidade de diminuir a população dessas pragas para se aumentar a eficiência produtiva (AMORIM et al., 2011).
Uma das formas de manejo de pragas e doenças na lavoura é o uso de plantas com propriedades inseticidas, repelentes, fungicidas e atrativas, consorciadas com as culturas ou uso de seus extratos vegetais. Tais plantas podem ser denominadas de fitossanitárias, pois estabilizam as populações de insetos nocivos à plantação, assim como favorecem as populações dos inimigos naturais (ANDOW, 1991). Ademais, também atuam individualmente no controle fitossanitário, uma vez que podem exalar substâncias que impedem a aproximação dos insetos (CORRÊA e SALGADO, 2011), lançar óleos essenciais (ISMAN, 2000) ou serem hospedeiros alternativos para as pragas, que acabam abandonando a cultura agrícola de interesse comercial do agricultor e passam a atacar essa planta (ZAMBOLIM et al., 2004).
Por fim, ao utilizar plantas fitossanitárias no controle de herbívoros e patógenos, as consequências maléficas do modelo agrícola convencional, que visa o uso indiscriminado de agrotóxicos, são reduzidas, tais como: evolução de resistência a inseticidas (TABASHNIK e ROUSH, 1990); poluição hídrica e do solo por produtos químicos (MERTEN e MINELLA, 2002); problemas de saúde dos agricultores devido ao contato direto e indireto com agrotóxicos (SCHMIDT e GODINHO, 2006; PIGNATI et al., 2017) e a produção de alimentos contaminados por venenos (SANTANA e MACHINSKI JUNIOR, 2004).
Por apresentarem vantagens ambientais, o uso das plantas fitossanitárias precisa ser amplamente divulgado. A região Centro-Oeste do Brasil ganha importante destaque, uma vez que a agricultura convencional vem se desenvolvendo nela de forma crescente (KLINK e MOREIRA, 2002). No Distrito Federal, a região administrativa de Planaltina pode ser considerada uma área produtora de alimentos de elevada importância, tais como hortaliças variadas, entre elas pimentão e tomate. Os produtores de Planaltina, muitos assentados da reforma agrária (CORREIO BRAZILIENSE, 2017), são responsáveis pelo abastecimento de redes de supermercados do Distrito Federal, Tocantins, Goiás e Amazonas (JORNAL DE BRASÍLIA, 2014). Por serem agricultores com menor poder aquisitivo, o que deve dificultar a compra de agrotóxicos, visto que os agricultores familiares, geralmente, enfrentam dificuldades econômicas (ROGATTO, 2013), a hipótese testada no presente estudo é a de que os agricultores familiares de Planaltina (DF) possam ser conhecedores de formas alternativas de controle de pragas e doenças, como o uso de plantas fitossanitárias.
Dado o exposto, o presente estudo justifica-se pela necessidade de se estimular o uso sistematizado de plantas fitossanitárias no manejo de pragas e doenças, a fim de se alcançar uma agricultura mais racional e sustentável, aliada à produção de alimentos mais saudáveis. Para tanto, faz- se necessário criar agroecossistemas sustentáveis por meio da Agroecologia, utilizando a sua dimensão ecológica e técnico-agronômica, bem como, a diversidade cultural das comunidades rurais (CASADO et al., 2000). Por exemplo, o controle de pragas das culturas pode ser feito por meio do Manejo Integrado de Pragas (MIP), que visa manter a abundância da população de pragas abaixo do nível do dano econômico pela utilização de diferentes técnicas de controle de forma econômica, ecológica e social (PICANÇO e GUEDES, 1999), associado ao desenvolvimento rural socialmente justo e ambientalmente correto (CASADO et al., 2000).
Dessa forma, conhecer e divulgar as plantas fitossanitárias usadas pelos agricultores familiares no intuito de se identificar, por meio do conhecimento popular, quais são as mais eficientes ao combate de pragas e doenças, pode ser uma das formas de se tentar alcançar um desenvolvimento rural mais sustentável. Portanto, nesse trabalho foi caracterizado o uso de plantas fitossanitárias pela população rural de Planaltina, Distrito Federal. Além disso, a partir desse resultado, nós elucidamos qual foi a planta fitossanitária mais citada, o tipo de cultura mais suscetível e os tipos de parasitas mais combatidos.
O presente trabalho foi desenvolvido em 2015, na região administrativa de Planaltina, situada no Distrito Federal, que é uma importante área produtora de olerícolas. Especificamente, a pesquisa foirealizada com agricultores familiares do Núcleo Rural Santos Dumont, que é formado por 87 propriedades rurais (AGÊNCIA BRASÍLIA, 2017).
Primeiramente, antes de qualquer coleta de dados, o projeto de pesquisa do presente estudo foi avaliado pelo Comitê de Ética em Pesquisa da Secretaria de Estado de Saúde do Distrito Federal (CEP/SES-DF), após submissão na Plataforma Brasil. Sua realização foi aprovada pelo CEP/SES-DF (No do processo: 30849214.4.0000.5553).
A técnica de reconhecimento de potenciais entrevistados foi a do método bola-de-neve. Nessa técnica, um conhecedor de plantas fitossanitárias participante da entrevista indica sucessivamente outro conhecedor do assunto que é entrevistado a posteriori (ALBUQUERQUE et al., 2010). O método é bastante promissor, pois otimiza o sucesso do levantamento etnobotânico.
No final, foram entrevistados 30 agricultores, todos maiores de idade. Infelizmente, um maior esforço amostral não foi alcançado, pois muitos agricultores selecionados pelo método não tiveram interesse em participar ou não se disponibilizaram a assinar o termo de consentimento livre e esclarecido (TCLE). Quando os agricultores concordavam em participar da entrevista, uma cópia do TCLE era entregue ao entrevistado e outra cópia ficava com a pesquisadora/entrevistadora.
As entrevistas foram semiestruturadas com perguntas prévias (abertas e fechadas) e natureza interativa. Nesse tipo de abordagem, os questionamentos são previamente elaborados pelo pesquisador, porém, ela permite que novos dados e elementos sejam acrescentados ao longo da entrevista, de acordo com seu encaminhamento (ALBUQUERQUE et al., 2010).
As perguntas da entrevista abordaram questões sobre o perfil social do entrevistado e sobre as plantas fitossanitárias usadas pelos agricultores. Por meio da listagem livre, os colaboradores foram solicitados a citar nomes populares das plantas usadas e, a partir dessa listagem, foram direcionados à entrevista semiestruturada, a fim de se obterem informações específicas sobre cada planta mencionada (ALEXIADES e SHELDON, 1996). Os pontos abordados nas entrevistas encontram-se na Tabela 1. No total, foram feitas 12 perguntas que discutiam tanto questões sociais, quanto conhecimentos gerais acerca das plantas fitossanitárias, além de oito perguntas específicas de cada planta fitossanitária citada nas respostas dadas às perguntas gerais.


  Tabela 1. Itens abordados nas questões semiestruturadas das                          entrevistas.                                                                                                        
Questões gerais
Questões específicas de cada planta
1- Idade
1- Nome da planta fitossanitária
2- Sexo
2- Indicações agronômicas para o uso da planta fitossanitária
(repelente, inseticida, fungicida, atrativa, etc.)
3- Local de nascimento
3- Organismo alvo que a fitossanitária combate
4- Local onde cresceu
4- Hábito (erva, capim, subarbusto, arbusto, árvore, etc.) da
fitossanitária
5- Grau de escolaridade
5- Local de coleta da fitossanitária (natureza, quintal, área de
cultivo ou comércio);
6- Fonte de obtenção do conhecimento
6- Tipo de uso da fitossanitária (indivíduo inteiro plantado
perto das culturas, pulverização do extrato líquido, uso do óleo essencial botânico ou outro tipo de uso)
7- Transferência do conhecimento
7- Parte da fitossanitária usada (raiz, casca, folha, fruto,
semente, flor ou toda a planta) para fabricação de extrato pelos entrevistados
8- Principais plantas fitossanitárias usadas
8- Possíveis efeitos negativos do uso dessa fitossanitária no
desempenho das culturas agrícolas
9- Principais problemas agronômicos relatados para o uso das
fitossanitárias
10- Principais organismos alvo que as fitossanitárias combatem
11- Lavoura mais suscetível aos organismos alvo

   12- Algum problema colateral devido ao uso das fitossanitárias                                                                                                                               

Antes das análises dos resultados, foram identificados o nome da espécie e a família da planta citada por cada entrevistado, usando-se o nome popular, hábito, fotografias e a literatura (LORENZI e MATOS, 2008; MATOS et al., 2011), sendo tais informações confirmadas nos sites Flora do Brasil 2020 em construção e Tropicos. A partir disso, foi feita uma lista de espécies das plantas fitossanitárias utilizadas e de suas indicações agronômicas.
Para os dados socioeconômicos, foi verificado se havia diferença estatística entre os entrevistados em relação à faixa etária, ao local de origem e de crescimento, tipos de fontes de obtenção do conhecimento e nível de escolaridade. Posteriormente, foi realizada verificação estatística do efeito do local de nascimento, local de crescimento, tipo de fontes de obtenção do conhecimento e nível de escolaridade sobre o conhecimento acerca das plantas fitossanitárias.
Para os dados sobre cada planta e seus usos, foram determinados, estatisticamente, a mais citada, o tipo de cultura mais suscetível e os tipos de parasitas mais combatidos pelas fitossanitárias (mastigador, raspador, brocador de frutos, sugador e patógenos).
Para tanto, todos os dados foram testados quanto a sua normalidade. Considerando que a análise preliminar (Shapiro-Wilk) revelou ausência de normalidade em todos os dados, as análises foram determinadas pelo teste Kruskal-Wallis. Para identificar possíveis fontes de variação nos dados analisados anteriormente, a comparação par-a-par foi feita por meio do teste de Mann-Whitney. Todas as análises foram conduzidas usando o software Past 3.18 (HAMMER et al., 2001), utilizando alfa igual a 5%.
Dos trinta entrevistados, a maioria estava na faixa etária dos 30 a 59 anos de idade, abrangendo o grupo dos adultos (53,33%). Os idosos, a partir dos 60 anos, corresponderam a 30% dos entrevistados. Os jovens, na faixa dos 20 anos, eram 16,67% dos entrevistados e foram estatisticamente menos representativos do que os adultos (H = 6,132; p < 0,05). Foi observado que a maioria dos jovens que permaneceu no campo não tinha conhecimento sobre o uso das plantas fitossanitárias, uma vez que não foram selecionados para as entrevistas, devido à técnica de reconhecimento dos potenciais entrevistados ter sido bola-de-neve.
Dos agricultores entrevistados, 44% eram do sexo feminino e 56% do sexo masculino. A maioria nasceu no Nordeste (36,67%), seguida pelas regiões Centro-Oeste (30%), Sudeste (20%) e Sul (6,67%). Em torno de 6,7% dos entrevistados nasceram no Japão. Ao comparar estatisticamente a origem dos entrevistados, foi demonstrado que os agricultores oriundos da região Sul e do Japão foram menos representativos nas entrevistas do que os originados do Nordeste, Centro-Oeste e Sudeste (H = 6,556; p
< 0,05).
A partir das entrevistas, foi constato que os agricultores migraram para Planaltina no decorrer de suas vidas, pois aqueles que cresceram na região Nordeste foram 30%, Centro-Oeste 36,67%, Sudeste 16,67%, Sul 6,67% e Japão 10%. Novamente, apenas os entrevistados que cresceram no Sul do Brasil e no Japão se diferenciaram estatisticamente dos demais, uma vez que representaram a minoria (H = 5,96; p < 0,05).
A migração para Planaltina ocorreu durante diferentes períodos. Apesar de ser uma cidade histórica, criada em 1859 (CORREIO BRAZILIENSE, 2017), o grande afluxo de imigrantes para a cidade foi mais intenso no período da construção de Brasília, quando ocorreu o incentivo da vinda de mão de obra para o gigantesco empreendimento republicano (PDAD, 2011) e após criação de programas de colonização e reforma agrária na região, como o Programa de Assentamento Dirigido do DF (PAD/DF), em que há áreas de cultivo entre Planaltina e Paranoá para plantio de cereais e cultivo de hortifrutigranjeiros (CORREIO BRAZILIENSE, 2017).
O uso e conhecimento das plantas fitossanitárias pelos agricultores não foi influenciado pelo local de nascimento e crescimento de cada um. Tal resultado demonstra que o conhecimento sobre esse tipo de manejo era homogêneo entre os entrevistados oriundos do NE, CO e SE (Hc = 0,3585; p > 0,05) e entre os entrevistados que também cresceram nessas regiões (Hc = 0,3124; p > 0,05). Portanto, pode-se concluir, para essa pesquisa, a inexistência de um determinante geográfico para o conhecimento etnobotânico das fitossanitárias, uma vez que eles apresentavam nível de conhecimento equivalente entre si. Infelizmente essas análises não foram feitas para os entrevistados nascidos e crescidos no Japão e na região Sul, devido ao baixo número amostral.
Foi comprovado baixo nível escolar, pois 40% dos agricultores investigados não concluíram a educação básica e 6,67% eram analfabetos funcionais. 23,33% dos entrevistados concluíram apenas o ensino fundamental e a mesma porcentagem foi daqueles que finalizaram o ensino médio. Apenas 6,67% concluíram o ensino superior. Não foi observada uma relação clara entre o nível de escolaridade com o conhecimento sobre as plantas fitossanitárias (H = 2,261; p > 0,05). Provavelmente, a educação formal escolar não prioriza esse tipo de informação, ensinando outros conteúdos nas escolas (PCN, 2000), o que é extremamente frustrante ao se pensar que este é um tipo de conhecimento prático que pode efetivamente melhorar as condições de vida das pessoas, principalmente daquelas que apresentam uma ligação rural.
O aprendizado etnobotânico dos agricultores foi considerado geracional e familiar, pois 53,33% aprenderam com familiares; enquanto 16,67% obtiveram o conhecimento de forma empírica; 10% aprenderam com terceiros; 10% aprenderam lendo livros e revistas; e 10% instruíram-se de outras formas não citadas nas entrevistas. Portanto, a partir desses dados, foi constatada diferença estatística entre as diferentes formas de se adquirir o conhecimento acerca das fitossanitárias (H = 5,256; p < 0,05). Porém, não foi observada relação entre o nível do conhecimento das plantas com os tipos de fontes de obtenção do conhecimento, dentre elas a forma de obtenção geracional, empírica e por estudos (Hc = 0,8782; p > 0,05).
Observando números absolutos de plantas fitossanitárias citadas pelos entrevistados, os mais conhecedores foram: em primeiro lugar, um entrevistado que adquiriu seu conhecimento por meio de estudos, cursos e leituras (10 plantas citadas); e, em segundo lugar, outro entrevistado que adquiriu seu conhecimento por meio geracional (sete plantas citadas). Os outros 28 agricultores investigados citaram de uma a três plantas que podem ser usadas no manejo de pragas. A partir dessa análise, percebe-se, então, que esse tipo de conhecimento, muitas vezes, deriva do interesse específico da pessoa envolvida no processo de obtenção de informações e referências.
Quando perguntado se os entrevistados ensinariam seus conhecimentos sobre plantas fitossanitárias a outras pessoas, 83,33% afirmaram gostar de ensinar seus saberes e 16,67% relataram não ensinar. Provavelmente, essa troca de conhecimentos ocorre mais entre membros de uma mesma família, que o saber se destacou por ser geracional.
Os agricultores citaram 22 espécies de plantas fitossanitárias (Tabela 2), das quais, a mais relatada foi o fumo, que se diferenciou estatisticamente das outras (H = 61,76; p < 0,01). Tal fato demonstra que o uso das plantas fitossanitárias foi inespecífico, uma vez que nenhum grupo de parasitas foi combatido de forma específica, que o uso de fumo nas culturas foi generalizado. As outras espécies de plantas fitossanitárias foram citadas apenas quatro vezes (gergelim e pimenta), três (citronela), cabacinha, coentro e hortelã (duas vezes) ou uma vez (as demais).
De acordo com o relatado nas entrevistas, foram contabilizadas 15 citações para o fumo, que deve ser usado tanto em consórcio quanto em extrato. O uso abundante de fumo por agricultores familiares também já foi relatado por Morais (2011). A toxicidade do fumo está relacionada à composição química de suas folhas com nicotina, alcalóide majoritário e, também, anabasina (LORENZI e MATOS, 2008). Apesar de ter sido muito citado como um inseticida natural pelos entrevistados, o fumo deve ser aplicado apenas nas folhas, caules e frutos não comestíveis, uma vez que seus compostos químicos são muito tóxicos para mamíferos (LOVATTO et al., 2004). Ademais, as culturas submetidas ao extrato de fumo precisam passar por um período de carência de pelo menos oito dias após a aplicação para serem colhidas (MARTÍ et al., 2010). Portanto, sua utilização em demasia para controle biológico deve ser evitada (LOVATTO et al., 2004), tendo uso restrito na agricultura orgânica (MARTÍ et al., 2010). Além disso, a recomendação de seu uso é para pequenas culturas, pois o seu manuseio é perigoso para a saúde do agricultor e de seus animais (MATOS et al., 2011).

  Tabela 2. Descrição das plantas fitossanitárias utilizadas pelos agricultores familiares de Planaltina DF


Nome Popular
Nome Científico
Família
Hábito
Indicação
Consórcio
Extrato
Associada com outra planta
Alho
Allium sativum
Amaryllidaceae
Erva
Repelente

X

Arruda
Ruta graveolens
Rutaceae
Erva
Repelente

X

Bananeira
Musa paradisiaca
Musaceae
Erva
Barreira
X



Baru
Dipteryx alata
Fabaceae
Árvore
Inseticida

X
X
Cabacinha
Luffa operculata
Cucurbitaceae
Liana
Atrativa
X



Café
Coffea arabica
Rubiaceae
Arbusto
Repelente

X

X

Capim elefante
Pennisetum purpureum
Poaceae
Capim
Barreira
X


Cebola
Allium cepa
Amaryllidaceae
Erva
Repelente

X


Citronela
Cymbopogon winterianus
Poaceae
Capim
Repelente
X


Coentro
Coriandrum sativum
Apiaceae
Erva
Atrativa
X


Erva doce
Foeniculum vulgare
Apiaceae
Erva
Atrativa
X



Espada de São Jorge

Sansevieria trifasciata
Asparagaceae
Erva
Barreira
X


Fumo
Nicotiana tabacum
Solanaceae
Erva, Subarbusto

Inseticida
X
X
X
Gergelim
Sesamum indicum
Pedaliaceae
Erva,
Subarbusto

Inseticida
X


Hortelã
Mentha spicata
Lamiaceae
Erva
Repelente
X


Laranjeira
Citrus sinensis
Rutaceae
Árvore
Atrativa
X
X

Lobeira
Solanum
lycocarpum

Solanaceae
Arbusto,
Árvore

Inseticida

X


Milho
Zea mays
Poaceae
Erva

Controle de nematoides no solo
X


Picão
Bidens pilosa
Asteraceae
Erva
Atrativa
X


Pimenta
Capsicum frutescens
Solanaceae
Arbusto
Repelente

X


Repolho
Brassica oleracea
Brassicaceae
Erva
Herbicida
X
X

Soja
Glycine max
Fabaceae
Erva
Controle de nematoides no solo
X




Após o fumo, os mais mencionados foram o gergelim e a pimenta, com quatro citações cada. O gergelim, segundo os agricultores, deve ser usado em consórcio com outras culturas, principalmente com as hortaliças, o que foi enfatizado por Boaretto e Forti (1997). De acordo com Martí et al. (2010), deve-se espalhar sementes de gergelim nos canteiros e sobre o formigueiro, pois as sementes intoxicam as formigas cortadeiras que levam o gergelim para o formigueiro, causando, assim, a morte do ninho de formigas. Cabe ressaltar que o cultivo do gergelim é de fácil manejo, pois a planta é tolerante à seca, tem bom potencial produtivo, além de ser pouco exigente em fertilidade do solo e água (ÁVILA e GRATEROL, 2005). Por fim, além de auxiliar no combate a folívoros, de acordo com os agricultores entrevistados, os grãos do gergelim podem ser vendidos (PERIN et al., 2010), o que incrementa a renda do agricultor familiar.
A pimenta pode ser usada na forma de extrato ou em consórcio, segundo os agricultores. A pimenta malagueta é utilizada na fabricação dos extratos, devido à presença em grande quantidade do alcalóide capsicina (FILGUEIRA, 2005). A concentração de capsaicinóides está relacionada à atividade antibacteriana (CARVALHO et al., 2005). Plantas com alcalóide também são evitadas por animais, pois ele confere gosto amargo e toxidez (SANTOS e MELLO 2010).
A citronela foi citada por três agricultores que observaram o poder da planta consorciada a outras culturas para afugentar vários tipos de mosquitos. Apesar de não ter sido citado o uso de seu extrato, o óleo essencial da citronela é a forma mais comum de combate aos insetos, que ele contém geraniol e citronela (LIN, 1998). Testes in vitro também comprovaram o efeito benéfico do extrato de citronela no controle de mosca branca (TAVARES et al., 2010).
A maioria das plantas citadas forma o grupo das plantas repelentes (alho, arruda, cebola, hortelã) ou atrativas (cabacinha, coentro, erva-doce e laranja). As plantas repelentes geralmente são aromáticas e desviam os ataques às plantações devido ao cheiro forte, podendo ser usadas em consórcio ou em extratos, segundo o relato dos agricultores. Seu odor, geralmente, é originado de óleos essenciais (LORENZI e MATOS, 2008; MATOS et al., 2011), tais como limoneno, alfa-pineno e beta- pineno (exemplos dos terpenoides do óleo essencial de limão) (ASCHERI et al., 2003). Já as plantas atrativas podem atrair os herbívoros devido ao cheiro que exalam por conta de seus óleos essenciais ou porque oferecem vasta quantidade de recursos alimentares (PANIZZA, 1999).
De acordo com um entrevistado, a hortelã em consórcio repele insetos que prejudicam a cultura da couve. Martí et al. (2010) e Previero et al. (2010) afirmam que o aroma da hortelã afasta lepidópteros, formigas e até ratos, por isso, ela deve ser plantada na bordadura das lavouras. O óleo de hortelã, também, apresenta elevado potencial fungicida sob o crescimento do fungo da antracnose (SOUSA et al., 2012). Ademais, sua utilização é facilitada, uma vez que apresenta crescimento vigoroso em lavouras, pois cresce em condições adversas, sem muita exigência de manejo e fertilidade do solo (LORENZI e MATOS, 2008). Da mesma maneira, seu extrato aquoso ou chá pode ser aplicado sobre a cultura, pois a hortelã é um repelente natural de insetos em geral (PREVIERO et al., 2010).
A arruda afugenta os insetos, como formigas cortadeiras, de acordo com a observação de um entrevistado que também afirmou que seu extrato aquoso combate lagartas. Martí et al. (2010) declaram que o extrato aquoso de arruda repele formigas e ratos, além de combater pulgões e inibir 100% o crescimento de vários fungos fitopatogênicos (SCHWAN-ESTRADA et al., 2000).
Segundo relato de um entrevistado, alho e cebola são utilizados para fazer extratos aquosos, sendo muito eficazes para repelir insetos folívoros de hortaliças. O extrato de alho, em especial, pode ser usado no controle de larvas de lepidópteros, pulgões e fungos patogênicos (BRECHELT, 2004). o extrato de cebola controla população de lagartas, vaquinhas e pulgões (MARTÍ et al., 2010). Entretanto, a cebola é considera tóxica para grandes animais pastadores, como bovinos (KOGER, 1956), equinos (THORP e HARSHFIELD, 1939) e ovinos (VAN KAMPEN et al., 1970) quando ingerida em grande quantidade de uma única vez, pois o princípio bioativo da cebola, n-propil dissulfito, causa a transformação da hemoglobina em metemoglobina. Por conta disso, os animais ficam apáticos, hipotérmicos e com coloração arroxeada (WEISER 1992).
A cabacinha, segundo os dois agricultores que a relataram, funciona como plant a atrativa, pois atrai insetos herbívoros para o seu fruto. Provavelmente, a cabacinha foi citada na pesquisa, pois é muito usada em práticas nordestinas, uma vez que muitos dos entrevistados nasceram na região Nordeste do país.
O coentro atrai, especificamente, vaquinha, mosca branca e pulgão como relatado pelos entrevistados. Entretanto, segundo Martí et al. (2010), o coentro repele ácaros e pulgões. Além disso, de acordo com Togni et al. (2010), a presença do coentro beneficia a abundância e a diversidade de inimigos naturais, sendo uma excelente alternativa de consórcio com o cultivo de tomate. Essa atração pode ser explicada pela composição química do coentro, destacando-se seu óleo essencial, pectinas, mucilagem e flavonoides (PANIZZA, 1999).
A erva-doce foi citada por um entrevistado como atrativa para o pulgão que ataca brócolis e feijão. Provavelmente, isso ocorre devido à presença de muitos recursos alimentares para os insetos. Segundo Couto (2006), a erva-doce apresenta folhas compostas de morfologias variadas, inflorescências em umbelas com flores pequenas e brancas, bem como frutos com cheiro forte e sabor adocicado. Além disso, a erva-doce apresenta crescimento vigoroso, formando touceiras (LORENZI e MATOS, 2008), o que aumenta a disponibilidade de biomassa para o consumo de herbívoros. Apesar de não ter sido citado o uso de seu extrato, ensaios de laboratório mostraram sua atividade inseticida e antifúngica (SIMÕES et al., 1998). Ademais, pesquisas demonstram que a erva-doce, assim como o coentro, também atrai inimigos naturais devido à liberação de seu óleo essencial, composto basicamente por (E)-anetol que possui característica adocicada (RESENDE et al., 2015).
O suco de laranja, também, pode ser usado como atrativo por conta de seu odor aromatizante. Segundo um dos agricultores, esse suco deve ser colocado em garrafas pet destampadas, que serão penduradas próximo às lavouras de frutas no início da produção. O suco atrai as moscas da fruta, que acabam morrendo afogadas. Essa técnica é chamada “garrafa caça-mosca”, sendo eficientemente utilizada com suco de laranja, de pêssego ou de uva (AGUIAR-MENEZES et al., 2006; MARTÍ et al., 2010). A armadilha pet para captura de moscas-das-frutas foi testada cientificamente, demonstrando ser extremamente hábil. Ela pode ser usada tanto em pomares comerciais quanto domésticos, como comprovado por Aguiar-Menezes et al. (2006).
O picão foi citado por um agricultor que o utiliza em consórcios com hortaliças. De acordo com ele, a planta é um atrativo para o pulgão, a vaquinha e a mosca branca. O estabelecimento de faixas com plantas espontâneas fora da área de cultivo também é estimulado na agricultura orgânica, pois elas serão refúgios para a fauna benéfica (PEREIRA e MELO, 2008). Entretanto, a própria literatura agronômica considera o picão como uma planta espontânea que compete com as culturas por espaço, nutrientes e água (FAVERO et al., 2001). Ademais, o picão, também, é reservatório de nematoides do gênero Meloidogyne, sendo seu hospedeiro nas entressafras (LORDELLO et al., 1975). Portanto, é aconselhada sua retirada manual da área de cultivo. Em função disso, estudos mais aprofundados sobre o uso do picão como planta fitossanitária necessitam ser realizados.
O capim elefante, a bananeira e a espada-de-são-jorge foram citados por agricultores como possíveis barreiras físicas à disseminação de pragas. Para eles, essas plantas fitossanitárias formam corredores que isolam a cultura de interesse do ataque de pragas, quando estão dispostas em linhas próximas às plantações, evitando que insetos ou doenças migrem de uma propriedade para outra. Zambolim et al. (2004) afirmam que as barreiras físicas são uma forma de controle de pragas, sendo formadas por corredores de plantas e/ou barreiras geográficas. No caso específico citado pelos agricultores, a bananeira, o capim-elefante e a espada-de-são-jorge formam touceiras, o que favorece a formação da barreira sanitária (MOURA et al., 2002; EMBRAPA, 2016).
O extrato de repolho foi relatado por um entrevistado como herbicida que pode ser usado para diminuir incidência de plantas espontâneas ao ser borrifado sobre elas. Rezende et al. (2016) também demonstrou, em seus estudos, que o extrato aquoso de repolho inibe a germinação de sementes e diminui o desenvolvimento das plântulas de alface, por meio da necrose do ápice radicular e torção do caule.
Quatro citações intrigantes de uso de fitossanitárias foram observadas. Duas plantas, milho e soja, fazem parte do grupo para controle de nematoides no solo. As outras duas, baru e café, fazem parte do grupo das plantas com ação secundária.
Provavelmente um agricultor citou o milho e a soja no controle de nematoides, pois elas são culturas hospedeiras desses tipos de vermes (CASELA et al., 2006; DIAS et al., 2010). Assim, os nematoides abandonariam as hortaliças cultivadas e infestariam as raízes dessas plantas. Entretanto, o uso do milho e da soja como atrativas de nematoides deve ser feito quando não houver plantações comerciais dessas espécies nas áreas circunvizinhas. Caso contrário, esse tipo de manejo poderá favorecer o surgimento de doenças causadas por nematoides, podendo ocorrer redução significativa da produção de grãos de milho e soja.
Das plantas com ação secundária, um entrevistado mencionou a borra do café misturada com fumo. De acordo com ele, ela combate os insetos comedores de folhas. Por fim, outro relatou sobre a casca do tronco do baru que deve ser deixada de molho com o fumo e, após curtidos por vários dias, devem ser borrifados nas plantas para combater folívoros. Os agricultores que citaram o café e o baru como plantas fitossanitárias afirmaram que nos dois casos é necessário acrescentar o fumo à mistura. Por isso, acredita-se que o efeito inseticida se deva à presença do fumo, uma vez que não foi encontrado nenhum relato na literatura da ação do café e do baru para combater pragas. Entretanto, uma pesquisa mais aprofundada necessita ser feita a fim de elucidar tais citações.
Os agricultores citaram as folhas (64,44%) como o principal recurso das fitossanitárias consorciadas com as culturas para atrair, combater ou afugentar as pragas. De acordo com eles, as plantas fitossanitárias devem ser plantadas ao acaso, junto com a cultura (43,24% dos casos) ou perto da cultura em linhas (32,43%). Outros tipos de distribuição das plantas fitossanitárias foram citados em menor proporção. A eficiência do consórcio de plantas fitossanitárias com culturas agrícolas para o manejo de pragas já foi demonstrada em diversos estudos. Por exemplo, Peres et al. (2009) demonstraram que o consórcio de cravo-de-defunto com melão diminuiu o ataque de tripes à cultura, já que o cravo-de-defunto funciona como planta atrativa. Martí et al. (2010) também indicou, em seu guia de campo, plantar gergelim nos aceiros dos cultivos ou em consórcios para atrair moscas.
Os agricultores também citaram as folhas (62,96%) como o órgão mais usado na fabricação dos extratos. Tal resultado corrobora o encontrado por Morais (2011), cuja pesquisa cita que 80% dos entrevistados detentores de conhecimento de fitossanitárias usam as folhas das mesmas para decocção e posterior aplicação no cultivo atacado. A maioria dos entrevistados do nosso estudo não relatou problemas com o uso dos extratos (93,33%). Entretanto, 6,66% dos entrevistados relataram a queima das folhas da cultura na qual foram aplicados os extratos de pimenta e/ou fumo. De acordo com Isman (2000), os óleos essenciais botânicos mais eficientes podem ser, também, os mais fitotóxicos, podendo levar a planta à morte. Por isso, guias de manejo alternativo de pragas sugerem que tais extratos precisam ser aplicados em dias nublados, mais frios e com pouco vento, caso contrário, causam danos nos tecidos das plantas cultivadas. Além disso, os extratos de defensivos mais fortes, como pimenta e fumo, devem ser preparados e aplicados por pessoas com equipamentos de proteção individual e em áreas sem crianças e animais domésticos (MARTÍ et al. 2010).
De acordo com os entrevistados, as lavouras mais suscetíveis apontadas no levantamento foram as hortaliças (70,59%), que se diferenciaram estatisticamente (H = 46,22; p < 0,01) das demais culturas de grãos (17,65%), frutos (8,82%) e flores (2,94%). Esse resultado era o esperado, pois as hortaliças são reconhecidas por exigirem frequentes tratos culturais por serem constantemente atacadas por pragas (NAKANO, 1999). Além disso, como elas são cultivadas, predominantemente, em áreas menores quando comparadas às grandes culturas (FILGUEIRA, 2005) e ao redor dos grandes centros (NAKANO, 1999), o cultivo de hortaliças é comumente realizado pelos agricultores do Núcleo Rural Santos Dumont em Planaltina, cujas propriedades têm tamanhos reduzidos. Por isso, elas foram amplamente citadas como as lavouras mais suscetíveis a pragas pelos entrevistados.
Os principais grupos de pragas mencionados pelos agricultores estão diretamente relacionados às lavouras mais suscetíveis, como as hortaliças. Por exemplo, foram citados insetos folívoros, como mastigadores e raspadores, insetos frugívoros, artrópodes sugadores e patógenos, ocorrendo maior predominância de mastigadores entre os grupos de pragas citados (H = 49,04; p < 0,01). Tal resultado demonstra que as plantas fitossanitárias são mais utilizadas para combater artrópodes herbívoros, como formiga cortadeira, lagarta, mosca branca, pulgão e vaquinha, do que patógenos.
O presente trabalho confirmou o conhecimento etnobotânico dos agricultores para um manejo de pragas e doenças sem o uso de agroquímicos. Entretanto, o uso de fumo necessita de melhor controle, uma vez que sua toxicidade é alta para seres humanos. Por isso, o trabalho demonstrou que novas pesquisas precisam ser feitas a fim de se elucidar os efeitos residuais do extrato do fumo na saúde das pessoas, pois foi demonstrado seu amplo uso em plantas que são alimentos crus. O trabalho demonstrou, do mesmo modo, que o conhecimento de plantas fitossanitárias estava restrito, principalmente no grupo dos adultos, e que tais agricultores apresentavam baixo nível escolar. As culturas mais suscetíveis à praga e manejadas com fitossanitárias foram as hortaliças, que são atacadas por variados grupos de parasitas, principalmente mastigadores. Por fim, os resultados do presente trabalho demonstram a urgência em se fazer divulgações de manejos alternativos de pragas com plantas fitossanitárias a agricultores familiares, por meio de cursos de capacitação, uma vez que o uso do fumo foi dominante em comparação com o uso de outras plantas menos danosas à saúde humana. Mesmo assim, o estudo demonstrou o grande potencial em se estudar modelos alternativos de manejo de pragas com os agricultores familiares do Brasil.


Agradecimentos
Agradecemos aos agricultores do Núcleo Rural Santos Dumont pela disponibilidade para participar das entrevistas e ao IFB/CNPq pela bolsa de iniciação à pesquisa da primeira autora. Agradecemos aos revisores anônimos da Revista Brasileira de Agroecologia pelas valiosas sugestões que aprimoraram nosso trabalho.

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Ferreira On 11/28/2018 02:00:00 AM Comentarios

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quarta-feira, 28 de novembro de 2018

LEVANTAMENTO DE PLANTAS FITOSSANITÁRIAS UTILIZADAS NO MANEJO DE PRAGAS AGRÍCOLAS


Autores: Érika Alexandra Sandra Gomes Oliveira Araújo 1; Silvia Dias                                   Costa  Fernandes 2; Francisco Roque 3; Marina Neves Delgado 4

1Graduação Tecnólogo em Agroecologia, Instituto Federal de Brasília, Campus      Planaltina E-   mail:  erikaediana@gmail.com
2Professora pesquisadora, Instituto Federal de Brasília, Campus Planaltina. E-    mail: silvia.fernandes@ifb.edu.br
3Professor pesquisador, Instituto Federal de Brasília, Campus Recanto das       Emas. E-mail: francisco.roque@ifb.edu.br
     4Professora pesquisadora, Instituto Federal de Brasília, Campus Planaltina. E-             mail: marina.delgado@etfbsb.edu.br

Fonte: Revista Brasileira de Agroecologia,  v.13, n.4, p.163-174, 2018.                              



RESUMO
O manejo de pragas com o uso de importante prática para se evitar perdas na produção agrícola. Nesse sentido, objetivou-se conhecer as plantas fitossanitárias usadas pelos agricultores familiares de Planaltina (DF), assim como determinar a mais utilizada, o tipo de cultura mais suscetível e o tipo de parasita mais combatido. Foram realizadas trinta entrevistas semiestruturadas no Núcleo Rural Santos Dumont. Shapiro-Wilk e Kruskal-Wallis foram estimados para a normalidade e distribuição das médias, respectivamente. O aprendizado dos agricultores sobre plantas fitossanitárias foi, principalmente, geracional. Porém, foi constado que esse conhecimento depende do interesse específico do produtor. Os agricultores citaram 22 espécies, sendo o fumo a mais relatada (H = 61,76; p <0,01). Plantas hortícolas foram as mais suscetíveis a pragas (H = 46,22; p < 0,01) e os principais problemas foram com insetos folívoros, sobretudo mastigadores (H = 49,04; p < 0,01). Constatou-se conhecimento dos agricultores para manejo de pragas sem o uso de agrotóxicos. No entanto, o uso de fumo necessita de melhor controle, pois sua toxicidade é alta para as pessoas.

Palavras-chave: Agricultura sustentável, Fumo, Insetos Folívoros, Plantas Hortícolas.

ABSTRACT

Pest management using phytosanitary plants is an important practice to avoid losses in agricultural production. In this regard, we aimed to know the phytosanitary plants used by the family farmers of Planaltina (DF) as well as to determine the most used phytosanitary plant, the most susceptible crop and the most combatted type of parasite. Thirty semi-structured interviews were conducted at Núcleo Rural Santos Dumont. Shapiro-Wilk and Kruskal-Wallis were estimated for the normality and distribution of the means, respectively. The farmers' learning about phytosanitary plants was mainly generational. Although, it was stated that this knowledge depends on the specific interest of the producer. The farmers cited 22 species, the most reported being tobacco (H = 61.76, p <0.01). Horticultural plants were the most susceptible to pests (H = 46.22, p <0.01) and the main problems were with folivores insects, mainly chewers (H = 49.04, p <0.01). It was determined the farmers' knowledge of pest management without the use of agrochemicals. However, the use of tabacco needs better control because its toxicity is high for people.

Keywords: Sustainable Agriculture, Tabacco, Folivores Insects, Horticultural Plants.




Organismos que invadem plantações são considerados pragas quando reduzem a produção de determinadas culturas, podendo ocasionar prejuízos econômicos ao agricultor (PICANÇO e GUEDES, 1999). Por isso, necessidade de diminuir a população dessas pragas para se aumentar a eficiência produtiva (AMORIM et al., 2011).
Uma das formas de manejo de pragas e doenças na lavoura é o uso de plantas com propriedades inseticidas, repelentes, fungicidas e atrativas, consorciadas com as culturas ou uso de seus extratos vegetais. Tais plantas podem ser denominadas de fitossanitárias, pois estabilizam as populações de insetos nocivos à plantação, assim como favorecem as populações dos inimigos naturais (ANDOW, 1991). Ademais, também atuam individualmente no controle fitossanitário, uma vez que podem exalar substâncias que impedem a aproximação dos insetos (CORRÊA e SALGADO, 2011), lançar óleos essenciais (ISMAN, 2000) ou serem hospedeiros alternativos para as pragas, que acabam abandonando a cultura agrícola de interesse comercial do agricultor e passam a atacar essa planta (ZAMBOLIM et al., 2004).
Por fim, ao utilizar plantas fitossanitárias no controle de herbívoros e patógenos, as consequências maléficas do modelo agrícola convencional, que visa o uso indiscriminado de agrotóxicos, são reduzidas, tais como: evolução de resistência a inseticidas (TABASHNIK e ROUSH, 1990); poluição hídrica e do solo por produtos químicos (MERTEN e MINELLA, 2002); problemas de saúde dos agricultores devido ao contato direto e indireto com agrotóxicos (SCHMIDT e GODINHO, 2006; PIGNATI et al., 2017) e a produção de alimentos contaminados por venenos (SANTANA e MACHINSKI JUNIOR, 2004).
Por apresentarem vantagens ambientais, o uso das plantas fitossanitárias precisa ser amplamente divulgado. A região Centro-Oeste do Brasil ganha importante destaque, uma vez que a agricultura convencional vem se desenvolvendo nela de forma crescente (KLINK e MOREIRA, 2002). No Distrito Federal, a região administrativa de Planaltina pode ser considerada uma área produtora de alimentos de elevada importância, tais como hortaliças variadas, entre elas pimentão e tomate. Os produtores de Planaltina, muitos assentados da reforma agrária (CORREIO BRAZILIENSE, 2017), são responsáveis pelo abastecimento de redes de supermercados do Distrito Federal, Tocantins, Goiás e Amazonas (JORNAL DE BRASÍLIA, 2014). Por serem agricultores com menor poder aquisitivo, o que deve dificultar a compra de agrotóxicos, visto que os agricultores familiares, geralmente, enfrentam dificuldades econômicas (ROGATTO, 2013), a hipótese testada no presente estudo é a de que os agricultores familiares de Planaltina (DF) possam ser conhecedores de formas alternativas de controle de pragas e doenças, como o uso de plantas fitossanitárias.
Dado o exposto, o presente estudo justifica-se pela necessidade de se estimular o uso sistematizado de plantas fitossanitárias no manejo de pragas e doenças, a fim de se alcançar uma agricultura mais racional e sustentável, aliada à produção de alimentos mais saudáveis. Para tanto, faz- se necessário criar agroecossistemas sustentáveis por meio da Agroecologia, utilizando a sua dimensão ecológica e técnico-agronômica, bem como, a diversidade cultural das comunidades rurais (CASADO et al., 2000). Por exemplo, o controle de pragas das culturas pode ser feito por meio do Manejo Integrado de Pragas (MIP), que visa manter a abundância da população de pragas abaixo do nível do dano econômico pela utilização de diferentes técnicas de controle de forma econômica, ecológica e social (PICANÇO e GUEDES, 1999), associado ao desenvolvimento rural socialmente justo e ambientalmente correto (CASADO et al., 2000).
Dessa forma, conhecer e divulgar as plantas fitossanitárias usadas pelos agricultores familiares no intuito de se identificar, por meio do conhecimento popular, quais são as mais eficientes ao combate de pragas e doenças, pode ser uma das formas de se tentar alcançar um desenvolvimento rural mais sustentável. Portanto, nesse trabalho foi caracterizado o uso de plantas fitossanitárias pela população rural de Planaltina, Distrito Federal. Além disso, a partir desse resultado, nós elucidamos qual foi a planta fitossanitária mais citada, o tipo de cultura mais suscetível e os tipos de parasitas mais combatidos.
O presente trabalho foi desenvolvido em 2015, na região administrativa de Planaltina, situada no Distrito Federal, que é uma importante área produtora de olerícolas. Especificamente, a pesquisa foirealizada com agricultores familiares do Núcleo Rural Santos Dumont, que é formado por 87 propriedades rurais (AGÊNCIA BRASÍLIA, 2017).
Primeiramente, antes de qualquer coleta de dados, o projeto de pesquisa do presente estudo foi avaliado pelo Comitê de Ética em Pesquisa da Secretaria de Estado de Saúde do Distrito Federal (CEP/SES-DF), após submissão na Plataforma Brasil. Sua realização foi aprovada pelo CEP/SES-DF (No do processo: 30849214.4.0000.5553).
A técnica de reconhecimento de potenciais entrevistados foi a do método bola-de-neve. Nessa técnica, um conhecedor de plantas fitossanitárias participante da entrevista indica sucessivamente outro conhecedor do assunto que é entrevistado a posteriori (ALBUQUERQUE et al., 2010). O método é bastante promissor, pois otimiza o sucesso do levantamento etnobotânico.
No final, foram entrevistados 30 agricultores, todos maiores de idade. Infelizmente, um maior esforço amostral não foi alcançado, pois muitos agricultores selecionados pelo método não tiveram interesse em participar ou não se disponibilizaram a assinar o termo de consentimento livre e esclarecido (TCLE). Quando os agricultores concordavam em participar da entrevista, uma cópia do TCLE era entregue ao entrevistado e outra cópia ficava com a pesquisadora/entrevistadora.
As entrevistas foram semiestruturadas com perguntas prévias (abertas e fechadas) e natureza interativa. Nesse tipo de abordagem, os questionamentos são previamente elaborados pelo pesquisador, porém, ela permite que novos dados e elementos sejam acrescentados ao longo da entrevista, de acordo com seu encaminhamento (ALBUQUERQUE et al., 2010).
As perguntas da entrevista abordaram questões sobre o perfil social do entrevistado e sobre as plantas fitossanitárias usadas pelos agricultores. Por meio da listagem livre, os colaboradores foram solicitados a citar nomes populares das plantas usadas e, a partir dessa listagem, foram direcionados à entrevista semiestruturada, a fim de se obterem informações específicas sobre cada planta mencionada (ALEXIADES e SHELDON, 1996). Os pontos abordados nas entrevistas encontram-se na Tabela 1. No total, foram feitas 12 perguntas que discutiam tanto questões sociais, quanto conhecimentos gerais acerca das plantas fitossanitárias, além de oito perguntas específicas de cada planta fitossanitária citada nas respostas dadas às perguntas gerais.


  Tabela 1. Itens abordados nas questões semiestruturadas das                          entrevistas.                                                                                                        
Questões gerais
Questões específicas de cada planta
1- Idade
1- Nome da planta fitossanitária
2- Sexo
2- Indicações agronômicas para o uso da planta fitossanitária
(repelente, inseticida, fungicida, atrativa, etc.)
3- Local de nascimento
3- Organismo alvo que a fitossanitária combate
4- Local onde cresceu
4- Hábito (erva, capim, subarbusto, arbusto, árvore, etc.) da
fitossanitária
5- Grau de escolaridade
5- Local de coleta da fitossanitária (natureza, quintal, área de
cultivo ou comércio);
6- Fonte de obtenção do conhecimento
6- Tipo de uso da fitossanitária (indivíduo inteiro plantado
perto das culturas, pulverização do extrato líquido, uso do óleo essencial botânico ou outro tipo de uso)
7- Transferência do conhecimento
7- Parte da fitossanitária usada (raiz, casca, folha, fruto,
semente, flor ou toda a planta) para fabricação de extrato pelos entrevistados
8- Principais plantas fitossanitárias usadas
8- Possíveis efeitos negativos do uso dessa fitossanitária no
desempenho das culturas agrícolas
9- Principais problemas agronômicos relatados para o uso das
fitossanitárias
10- Principais organismos alvo que as fitossanitárias combatem
11- Lavoura mais suscetível aos organismos alvo

   12- Algum problema colateral devido ao uso das fitossanitárias                                                                                                                               

Antes das análises dos resultados, foram identificados o nome da espécie e a família da planta citada por cada entrevistado, usando-se o nome popular, hábito, fotografias e a literatura (LORENZI e MATOS, 2008; MATOS et al., 2011), sendo tais informações confirmadas nos sites Flora do Brasil 2020 em construção e Tropicos. A partir disso, foi feita uma lista de espécies das plantas fitossanitárias utilizadas e de suas indicações agronômicas.
Para os dados socioeconômicos, foi verificado se havia diferença estatística entre os entrevistados em relação à faixa etária, ao local de origem e de crescimento, tipos de fontes de obtenção do conhecimento e nível de escolaridade. Posteriormente, foi realizada verificação estatística do efeito do local de nascimento, local de crescimento, tipo de fontes de obtenção do conhecimento e nível de escolaridade sobre o conhecimento acerca das plantas fitossanitárias.
Para os dados sobre cada planta e seus usos, foram determinados, estatisticamente, a mais citada, o tipo de cultura mais suscetível e os tipos de parasitas mais combatidos pelas fitossanitárias (mastigador, raspador, brocador de frutos, sugador e patógenos).
Para tanto, todos os dados foram testados quanto a sua normalidade. Considerando que a análise preliminar (Shapiro-Wilk) revelou ausência de normalidade em todos os dados, as análises foram determinadas pelo teste Kruskal-Wallis. Para identificar possíveis fontes de variação nos dados analisados anteriormente, a comparação par-a-par foi feita por meio do teste de Mann-Whitney. Todas as análises foram conduzidas usando o software Past 3.18 (HAMMER et al., 2001), utilizando alfa igual a 5%.
Dos trinta entrevistados, a maioria estava na faixa etária dos 30 a 59 anos de idade, abrangendo o grupo dos adultos (53,33%). Os idosos, a partir dos 60 anos, corresponderam a 30% dos entrevistados. Os jovens, na faixa dos 20 anos, eram 16,67% dos entrevistados e foram estatisticamente menos representativos do que os adultos (H = 6,132; p < 0,05). Foi observado que a maioria dos jovens que permaneceu no campo não tinha conhecimento sobre o uso das plantas fitossanitárias, uma vez que não foram selecionados para as entrevistas, devido à técnica de reconhecimento dos potenciais entrevistados ter sido bola-de-neve.
Dos agricultores entrevistados, 44% eram do sexo feminino e 56% do sexo masculino. A maioria nasceu no Nordeste (36,67%), seguida pelas regiões Centro-Oeste (30%), Sudeste (20%) e Sul (6,67%). Em torno de 6,7% dos entrevistados nasceram no Japão. Ao comparar estatisticamente a origem dos entrevistados, foi demonstrado que os agricultores oriundos da região Sul e do Japão foram menos representativos nas entrevistas do que os originados do Nordeste, Centro-Oeste e Sudeste (H = 6,556; p
< 0,05).
A partir das entrevistas, foi constato que os agricultores migraram para Planaltina no decorrer de suas vidas, pois aqueles que cresceram na região Nordeste foram 30%, Centro-Oeste 36,67%, Sudeste 16,67%, Sul 6,67% e Japão 10%. Novamente, apenas os entrevistados que cresceram no Sul do Brasil e no Japão se diferenciaram estatisticamente dos demais, uma vez que representaram a minoria (H = 5,96; p < 0,05).
A migração para Planaltina ocorreu durante diferentes períodos. Apesar de ser uma cidade histórica, criada em 1859 (CORREIO BRAZILIENSE, 2017), o grande afluxo de imigrantes para a cidade foi mais intenso no período da construção de Brasília, quando ocorreu o incentivo da vinda de mão de obra para o gigantesco empreendimento republicano (PDAD, 2011) e após criação de programas de colonização e reforma agrária na região, como o Programa de Assentamento Dirigido do DF (PAD/DF), em que há áreas de cultivo entre Planaltina e Paranoá para plantio de cereais e cultivo de hortifrutigranjeiros (CORREIO BRAZILIENSE, 2017).
O uso e conhecimento das plantas fitossanitárias pelos agricultores não foi influenciado pelo local de nascimento e crescimento de cada um. Tal resultado demonstra que o conhecimento sobre esse tipo de manejo era homogêneo entre os entrevistados oriundos do NE, CO e SE (Hc = 0,3585; p > 0,05) e entre os entrevistados que também cresceram nessas regiões (Hc = 0,3124; p > 0,05). Portanto, pode-se concluir, para essa pesquisa, a inexistência de um determinante geográfico para o conhecimento etnobotânico das fitossanitárias, uma vez que eles apresentavam nível de conhecimento equivalente entre si. Infelizmente essas análises não foram feitas para os entrevistados nascidos e crescidos no Japão e na região Sul, devido ao baixo número amostral.
Foi comprovado baixo nível escolar, pois 40% dos agricultores investigados não concluíram a educação básica e 6,67% eram analfabetos funcionais. 23,33% dos entrevistados concluíram apenas o ensino fundamental e a mesma porcentagem foi daqueles que finalizaram o ensino médio. Apenas 6,67% concluíram o ensino superior. Não foi observada uma relação clara entre o nível de escolaridade com o conhecimento sobre as plantas fitossanitárias (H = 2,261; p > 0,05). Provavelmente, a educação formal escolar não prioriza esse tipo de informação, ensinando outros conteúdos nas escolas (PCN, 2000), o que é extremamente frustrante ao se pensar que este é um tipo de conhecimento prático que pode efetivamente melhorar as condições de vida das pessoas, principalmente daquelas que apresentam uma ligação rural.
O aprendizado etnobotânico dos agricultores foi considerado geracional e familiar, pois 53,33% aprenderam com familiares; enquanto 16,67% obtiveram o conhecimento de forma empírica; 10% aprenderam com terceiros; 10% aprenderam lendo livros e revistas; e 10% instruíram-se de outras formas não citadas nas entrevistas. Portanto, a partir desses dados, foi constatada diferença estatística entre as diferentes formas de se adquirir o conhecimento acerca das fitossanitárias (H = 5,256; p < 0,05). Porém, não foi observada relação entre o nível do conhecimento das plantas com os tipos de fontes de obtenção do conhecimento, dentre elas a forma de obtenção geracional, empírica e por estudos (Hc = 0,8782; p > 0,05).
Observando números absolutos de plantas fitossanitárias citadas pelos entrevistados, os mais conhecedores foram: em primeiro lugar, um entrevistado que adquiriu seu conhecimento por meio de estudos, cursos e leituras (10 plantas citadas); e, em segundo lugar, outro entrevistado que adquiriu seu conhecimento por meio geracional (sete plantas citadas). Os outros 28 agricultores investigados citaram de uma a três plantas que podem ser usadas no manejo de pragas. A partir dessa análise, percebe-se, então, que esse tipo de conhecimento, muitas vezes, deriva do interesse específico da pessoa envolvida no processo de obtenção de informações e referências.
Quando perguntado se os entrevistados ensinariam seus conhecimentos sobre plantas fitossanitárias a outras pessoas, 83,33% afirmaram gostar de ensinar seus saberes e 16,67% relataram não ensinar. Provavelmente, essa troca de conhecimentos ocorre mais entre membros de uma mesma família, que o saber se destacou por ser geracional.
Os agricultores citaram 22 espécies de plantas fitossanitárias (Tabela 2), das quais, a mais relatada foi o fumo, que se diferenciou estatisticamente das outras (H = 61,76; p < 0,01). Tal fato demonstra que o uso das plantas fitossanitárias foi inespecífico, uma vez que nenhum grupo de parasitas foi combatido de forma específica, que o uso de fumo nas culturas foi generalizado. As outras espécies de plantas fitossanitárias foram citadas apenas quatro vezes (gergelim e pimenta), três (citronela), cabacinha, coentro e hortelã (duas vezes) ou uma vez (as demais).
De acordo com o relatado nas entrevistas, foram contabilizadas 15 citações para o fumo, que deve ser usado tanto em consórcio quanto em extrato. O uso abundante de fumo por agricultores familiares também já foi relatado por Morais (2011). A toxicidade do fumo está relacionada à composição química de suas folhas com nicotina, alcalóide majoritário e, também, anabasina (LORENZI e MATOS, 2008). Apesar de ter sido muito citado como um inseticida natural pelos entrevistados, o fumo deve ser aplicado apenas nas folhas, caules e frutos não comestíveis, uma vez que seus compostos químicos são muito tóxicos para mamíferos (LOVATTO et al., 2004). Ademais, as culturas submetidas ao extrato de fumo precisam passar por um período de carência de pelo menos oito dias após a aplicação para serem colhidas (MARTÍ et al., 2010). Portanto, sua utilização em demasia para controle biológico deve ser evitada (LOVATTO et al., 2004), tendo uso restrito na agricultura orgânica (MARTÍ et al., 2010). Além disso, a recomendação de seu uso é para pequenas culturas, pois o seu manuseio é perigoso para a saúde do agricultor e de seus animais (MATOS et al., 2011).

  Tabela 2. Descrição das plantas fitossanitárias utilizadas pelos agricultores familiares de Planaltina DF


Nome Popular
Nome Científico
Família
Hábito
Indicação
Consórcio
Extrato
Associada com outra planta
Alho
Allium sativum
Amaryllidaceae
Erva
Repelente

X

Arruda
Ruta graveolens
Rutaceae
Erva
Repelente

X

Bananeira
Musa paradisiaca
Musaceae
Erva
Barreira
X



Baru
Dipteryx alata
Fabaceae
Árvore
Inseticida

X
X
Cabacinha
Luffa operculata
Cucurbitaceae
Liana
Atrativa
X



Café
Coffea arabica
Rubiaceae
Arbusto
Repelente

X

X

Capim elefante
Pennisetum purpureum
Poaceae
Capim
Barreira
X


Cebola
Allium cepa
Amaryllidaceae
Erva
Repelente

X


Citronela
Cymbopogon winterianus
Poaceae
Capim
Repelente
X


Coentro
Coriandrum sativum
Apiaceae
Erva
Atrativa
X


Erva doce
Foeniculum vulgare
Apiaceae
Erva
Atrativa
X



Espada de São Jorge

Sansevieria trifasciata
Asparagaceae
Erva
Barreira
X


Fumo
Nicotiana tabacum
Solanaceae
Erva, Subarbusto

Inseticida
X
X
X
Gergelim
Sesamum indicum
Pedaliaceae
Erva,
Subarbusto

Inseticida
X


Hortelã
Mentha spicata
Lamiaceae
Erva
Repelente
X


Laranjeira
Citrus sinensis
Rutaceae
Árvore
Atrativa
X
X

Lobeira
Solanum
lycocarpum

Solanaceae
Arbusto,
Árvore

Inseticida

X


Milho
Zea mays
Poaceae
Erva

Controle de nematoides no solo
X


Picão
Bidens pilosa
Asteraceae
Erva
Atrativa
X


Pimenta
Capsicum frutescens
Solanaceae
Arbusto
Repelente

X


Repolho
Brassica oleracea
Brassicaceae
Erva
Herbicida
X
X

Soja
Glycine max
Fabaceae
Erva
Controle de nematoides no solo
X




Após o fumo, os mais mencionados foram o gergelim e a pimenta, com quatro citações cada. O gergelim, segundo os agricultores, deve ser usado em consórcio com outras culturas, principalmente com as hortaliças, o que foi enfatizado por Boaretto e Forti (1997). De acordo com Martí et al. (2010), deve-se espalhar sementes de gergelim nos canteiros e sobre o formigueiro, pois as sementes intoxicam as formigas cortadeiras que levam o gergelim para o formigueiro, causando, assim, a morte do ninho de formigas. Cabe ressaltar que o cultivo do gergelim é de fácil manejo, pois a planta é tolerante à seca, tem bom potencial produtivo, além de ser pouco exigente em fertilidade do solo e água (ÁVILA e GRATEROL, 2005). Por fim, além de auxiliar no combate a folívoros, de acordo com os agricultores entrevistados, os grãos do gergelim podem ser vendidos (PERIN et al., 2010), o que incrementa a renda do agricultor familiar.
A pimenta pode ser usada na forma de extrato ou em consórcio, segundo os agricultores. A pimenta malagueta é utilizada na fabricação dos extratos, devido à presença em grande quantidade do alcalóide capsicina (FILGUEIRA, 2005). A concentração de capsaicinóides está relacionada à atividade antibacteriana (CARVALHO et al., 2005). Plantas com alcalóide também são evitadas por animais, pois ele confere gosto amargo e toxidez (SANTOS e MELLO 2010).
A citronela foi citada por três agricultores que observaram o poder da planta consorciada a outras culturas para afugentar vários tipos de mosquitos. Apesar de não ter sido citado o uso de seu extrato, o óleo essencial da citronela é a forma mais comum de combate aos insetos, que ele contém geraniol e citronela (LIN, 1998). Testes in vitro também comprovaram o efeito benéfico do extrato de citronela no controle de mosca branca (TAVARES et al., 2010).
A maioria das plantas citadas forma o grupo das plantas repelentes (alho, arruda, cebola, hortelã) ou atrativas (cabacinha, coentro, erva-doce e laranja). As plantas repelentes geralmente são aromáticas e desviam os ataques às plantações devido ao cheiro forte, podendo ser usadas em consórcio ou em extratos, segundo o relato dos agricultores. Seu odor, geralmente, é originado de óleos essenciais (LORENZI e MATOS, 2008; MATOS et al., 2011), tais como limoneno, alfa-pineno e beta- pineno (exemplos dos terpenoides do óleo essencial de limão) (ASCHERI et al., 2003). Já as plantas atrativas podem atrair os herbívoros devido ao cheiro que exalam por conta de seus óleos essenciais ou porque oferecem vasta quantidade de recursos alimentares (PANIZZA, 1999).
De acordo com um entrevistado, a hortelã em consórcio repele insetos que prejudicam a cultura da couve. Martí et al. (2010) e Previero et al. (2010) afirmam que o aroma da hortelã afasta lepidópteros, formigas e até ratos, por isso, ela deve ser plantada na bordadura das lavouras. O óleo de hortelã, também, apresenta elevado potencial fungicida sob o crescimento do fungo da antracnose (SOUSA et al., 2012). Ademais, sua utilização é facilitada, uma vez que apresenta crescimento vigoroso em lavouras, pois cresce em condições adversas, sem muita exigência de manejo e fertilidade do solo (LORENZI e MATOS, 2008). Da mesma maneira, seu extrato aquoso ou chá pode ser aplicado sobre a cultura, pois a hortelã é um repelente natural de insetos em geral (PREVIERO et al., 2010).
A arruda afugenta os insetos, como formigas cortadeiras, de acordo com a observação de um entrevistado que também afirmou que seu extrato aquoso combate lagartas. Martí et al. (2010) declaram que o extrato aquoso de arruda repele formigas e ratos, além de combater pulgões e inibir 100% o crescimento de vários fungos fitopatogênicos (SCHWAN-ESTRADA et al., 2000).
Segundo relato de um entrevistado, alho e cebola são utilizados para fazer extratos aquosos, sendo muito eficazes para repelir insetos folívoros de hortaliças. O extrato de alho, em especial, pode ser usado no controle de larvas de lepidópteros, pulgões e fungos patogênicos (BRECHELT, 2004). o extrato de cebola controla população de lagartas, vaquinhas e pulgões (MARTÍ et al., 2010). Entretanto, a cebola é considera tóxica para grandes animais pastadores, como bovinos (KOGER, 1956), equinos (THORP e HARSHFIELD, 1939) e ovinos (VAN KAMPEN et al., 1970) quando ingerida em grande quantidade de uma única vez, pois o princípio bioativo da cebola, n-propil dissulfito, causa a transformação da hemoglobina em metemoglobina. Por conta disso, os animais ficam apáticos, hipotérmicos e com coloração arroxeada (WEISER 1992).
A cabacinha, segundo os dois agricultores que a relataram, funciona como plant a atrativa, pois atrai insetos herbívoros para o seu fruto. Provavelmente, a cabacinha foi citada na pesquisa, pois é muito usada em práticas nordestinas, uma vez que muitos dos entrevistados nasceram na região Nordeste do país.
O coentro atrai, especificamente, vaquinha, mosca branca e pulgão como relatado pelos entrevistados. Entretanto, segundo Martí et al. (2010), o coentro repele ácaros e pulgões. Além disso, de acordo com Togni et al. (2010), a presença do coentro beneficia a abundância e a diversidade de inimigos naturais, sendo uma excelente alternativa de consórcio com o cultivo de tomate. Essa atração pode ser explicada pela composição química do coentro, destacando-se seu óleo essencial, pectinas, mucilagem e flavonoides (PANIZZA, 1999).
A erva-doce foi citada por um entrevistado como atrativa para o pulgão que ataca brócolis e feijão. Provavelmente, isso ocorre devido à presença de muitos recursos alimentares para os insetos. Segundo Couto (2006), a erva-doce apresenta folhas compostas de morfologias variadas, inflorescências em umbelas com flores pequenas e brancas, bem como frutos com cheiro forte e sabor adocicado. Além disso, a erva-doce apresenta crescimento vigoroso, formando touceiras (LORENZI e MATOS, 2008), o que aumenta a disponibilidade de biomassa para o consumo de herbívoros. Apesar de não ter sido citado o uso de seu extrato, ensaios de laboratório mostraram sua atividade inseticida e antifúngica (SIMÕES et al., 1998). Ademais, pesquisas demonstram que a erva-doce, assim como o coentro, também atrai inimigos naturais devido à liberação de seu óleo essencial, composto basicamente por (E)-anetol que possui característica adocicada (RESENDE et al., 2015).
O suco de laranja, também, pode ser usado como atrativo por conta de seu odor aromatizante. Segundo um dos agricultores, esse suco deve ser colocado em garrafas pet destampadas, que serão penduradas próximo às lavouras de frutas no início da produção. O suco atrai as moscas da fruta, que acabam morrendo afogadas. Essa técnica é chamada “garrafa caça-mosca”, sendo eficientemente utilizada com suco de laranja, de pêssego ou de uva (AGUIAR-MENEZES et al., 2006; MARTÍ et al., 2010). A armadilha pet para captura de moscas-das-frutas foi testada cientificamente, demonstrando ser extremamente hábil. Ela pode ser usada tanto em pomares comerciais quanto domésticos, como comprovado por Aguiar-Menezes et al. (2006).
O picão foi citado por um agricultor que o utiliza em consórcios com hortaliças. De acordo com ele, a planta é um atrativo para o pulgão, a vaquinha e a mosca branca. O estabelecimento de faixas com plantas espontâneas fora da área de cultivo também é estimulado na agricultura orgânica, pois elas serão refúgios para a fauna benéfica (PEREIRA e MELO, 2008). Entretanto, a própria literatura agronômica considera o picão como uma planta espontânea que compete com as culturas por espaço, nutrientes e água (FAVERO et al., 2001). Ademais, o picão, também, é reservatório de nematoides do gênero Meloidogyne, sendo seu hospedeiro nas entressafras (LORDELLO et al., 1975). Portanto, é aconselhada sua retirada manual da área de cultivo. Em função disso, estudos mais aprofundados sobre o uso do picão como planta fitossanitária necessitam ser realizados.
O capim elefante, a bananeira e a espada-de-são-jorge foram citados por agricultores como possíveis barreiras físicas à disseminação de pragas. Para eles, essas plantas fitossanitárias formam corredores que isolam a cultura de interesse do ataque de pragas, quando estão dispostas em linhas próximas às plantações, evitando que insetos ou doenças migrem de uma propriedade para outra. Zambolim et al. (2004) afirmam que as barreiras físicas são uma forma de controle de pragas, sendo formadas por corredores de plantas e/ou barreiras geográficas. No caso específico citado pelos agricultores, a bananeira, o capim-elefante e a espada-de-são-jorge formam touceiras, o que favorece a formação da barreira sanitária (MOURA et al., 2002; EMBRAPA, 2016).
O extrato de repolho foi relatado por um entrevistado como herbicida que pode ser usado para diminuir incidência de plantas espontâneas ao ser borrifado sobre elas. Rezende et al. (2016) também demonstrou, em seus estudos, que o extrato aquoso de repolho inibe a germinação de sementes e diminui o desenvolvimento das plântulas de alface, por meio da necrose do ápice radicular e torção do caule.
Quatro citações intrigantes de uso de fitossanitárias foram observadas. Duas plantas, milho e soja, fazem parte do grupo para controle de nematoides no solo. As outras duas, baru e café, fazem parte do grupo das plantas com ação secundária.
Provavelmente um agricultor citou o milho e a soja no controle de nematoides, pois elas são culturas hospedeiras desses tipos de vermes (CASELA et al., 2006; DIAS et al., 2010). Assim, os nematoides abandonariam as hortaliças cultivadas e infestariam as raízes dessas plantas. Entretanto, o uso do milho e da soja como atrativas de nematoides deve ser feito quando não houver plantações comerciais dessas espécies nas áreas circunvizinhas. Caso contrário, esse tipo de manejo poderá favorecer o surgimento de doenças causadas por nematoides, podendo ocorrer redução significativa da produção de grãos de milho e soja.
Das plantas com ação secundária, um entrevistado mencionou a borra do café misturada com fumo. De acordo com ele, ela combate os insetos comedores de folhas. Por fim, outro relatou sobre a casca do tronco do baru que deve ser deixada de molho com o fumo e, após curtidos por vários dias, devem ser borrifados nas plantas para combater folívoros. Os agricultores que citaram o café e o baru como plantas fitossanitárias afirmaram que nos dois casos é necessário acrescentar o fumo à mistura. Por isso, acredita-se que o efeito inseticida se deva à presença do fumo, uma vez que não foi encontrado nenhum relato na literatura da ação do café e do baru para combater pragas. Entretanto, uma pesquisa mais aprofundada necessita ser feita a fim de elucidar tais citações.
Os agricultores citaram as folhas (64,44%) como o principal recurso das fitossanitárias consorciadas com as culturas para atrair, combater ou afugentar as pragas. De acordo com eles, as plantas fitossanitárias devem ser plantadas ao acaso, junto com a cultura (43,24% dos casos) ou perto da cultura em linhas (32,43%). Outros tipos de distribuição das plantas fitossanitárias foram citados em menor proporção. A eficiência do consórcio de plantas fitossanitárias com culturas agrícolas para o manejo de pragas já foi demonstrada em diversos estudos. Por exemplo, Peres et al. (2009) demonstraram que o consórcio de cravo-de-defunto com melão diminuiu o ataque de tripes à cultura, já que o cravo-de-defunto funciona como planta atrativa. Martí et al. (2010) também indicou, em seu guia de campo, plantar gergelim nos aceiros dos cultivos ou em consórcios para atrair moscas.
Os agricultores também citaram as folhas (62,96%) como o órgão mais usado na fabricação dos extratos. Tal resultado corrobora o encontrado por Morais (2011), cuja pesquisa cita que 80% dos entrevistados detentores de conhecimento de fitossanitárias usam as folhas das mesmas para decocção e posterior aplicação no cultivo atacado. A maioria dos entrevistados do nosso estudo não relatou problemas com o uso dos extratos (93,33%). Entretanto, 6,66% dos entrevistados relataram a queima das folhas da cultura na qual foram aplicados os extratos de pimenta e/ou fumo. De acordo com Isman (2000), os óleos essenciais botânicos mais eficientes podem ser, também, os mais fitotóxicos, podendo levar a planta à morte. Por isso, guias de manejo alternativo de pragas sugerem que tais extratos precisam ser aplicados em dias nublados, mais frios e com pouco vento, caso contrário, causam danos nos tecidos das plantas cultivadas. Além disso, os extratos de defensivos mais fortes, como pimenta e fumo, devem ser preparados e aplicados por pessoas com equipamentos de proteção individual e em áreas sem crianças e animais domésticos (MARTÍ et al. 2010).
De acordo com os entrevistados, as lavouras mais suscetíveis apontadas no levantamento foram as hortaliças (70,59%), que se diferenciaram estatisticamente (H = 46,22; p < 0,01) das demais culturas de grãos (17,65%), frutos (8,82%) e flores (2,94%). Esse resultado era o esperado, pois as hortaliças são reconhecidas por exigirem frequentes tratos culturais por serem constantemente atacadas por pragas (NAKANO, 1999). Além disso, como elas são cultivadas, predominantemente, em áreas menores quando comparadas às grandes culturas (FILGUEIRA, 2005) e ao redor dos grandes centros (NAKANO, 1999), o cultivo de hortaliças é comumente realizado pelos agricultores do Núcleo Rural Santos Dumont em Planaltina, cujas propriedades têm tamanhos reduzidos. Por isso, elas foram amplamente citadas como as lavouras mais suscetíveis a pragas pelos entrevistados.
Os principais grupos de pragas mencionados pelos agricultores estão diretamente relacionados às lavouras mais suscetíveis, como as hortaliças. Por exemplo, foram citados insetos folívoros, como mastigadores e raspadores, insetos frugívoros, artrópodes sugadores e patógenos, ocorrendo maior predominância de mastigadores entre os grupos de pragas citados (H = 49,04; p < 0,01). Tal resultado demonstra que as plantas fitossanitárias são mais utilizadas para combater artrópodes herbívoros, como formiga cortadeira, lagarta, mosca branca, pulgão e vaquinha, do que patógenos.
O presente trabalho confirmou o conhecimento etnobotânico dos agricultores para um manejo de pragas e doenças sem o uso de agroquímicos. Entretanto, o uso de fumo necessita de melhor controle, uma vez que sua toxicidade é alta para seres humanos. Por isso, o trabalho demonstrou que novas pesquisas precisam ser feitas a fim de se elucidar os efeitos residuais do extrato do fumo na saúde das pessoas, pois foi demonstrado seu amplo uso em plantas que são alimentos crus. O trabalho demonstrou, do mesmo modo, que o conhecimento de plantas fitossanitárias estava restrito, principalmente no grupo dos adultos, e que tais agricultores apresentavam baixo nível escolar. As culturas mais suscetíveis à praga e manejadas com fitossanitárias foram as hortaliças, que são atacadas por variados grupos de parasitas, principalmente mastigadores. Por fim, os resultados do presente trabalho demonstram a urgência em se fazer divulgações de manejos alternativos de pragas com plantas fitossanitárias a agricultores familiares, por meio de cursos de capacitação, uma vez que o uso do fumo foi dominante em comparação com o uso de outras plantas menos danosas à saúde humana. Mesmo assim, o estudo demonstrou o grande potencial em se estudar modelos alternativos de manejo de pragas com os agricultores familiares do Brasil.


Agradecimentos
Agradecemos aos agricultores do Núcleo Rural Santos Dumont pela disponibilidade para participar das entrevistas e ao IFB/CNPq pela bolsa de iniciação à pesquisa da primeira autora. Agradecemos aos revisores anônimos da Revista Brasileira de Agroecologia pelas valiosas sugestões que aprimoraram nosso trabalho.

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