quinta-feira, 10 de maio de 2018

Autor: Mariane Carvalho Vidal - Embrapa Hortaliças, Caixa Postal 218, CEP 70359-970, Brasília, DF. mariane@cnph.embrapa.br

Fonte: Hortic. bras., v.29, n. 2 (Suplemento - CD ROM), julho 2011.


INTRODUÇÃO
     No artigo publicado no ano passado sobre as 100 questões mais importantes para o futuro da agricultura global (Pretty et al., 2010), a sustentabilidade aparece como ponto fundamental para o desafio de alimentar uma população do ordem de 9 bilhões de pessoas projetada para um futuro próximo. Dessa forma, o panorama para os próximos anos indica a necessidade de profundos câmbios em nosso sistema produtivo.
     O cultivo orgânico aparece não somente como uma forma alternativa ao sistema agroindustrial atual da agricultura mais, como uma forte base para uma mudança de paradigma da relação da sociedade com a agricultura. O resgate das questões sociais, ecológicas e ambientais no trato com a agricultura é o grande diferencial desse sistema, pois permite a equidade e o equilíbrio das relações e a sua sustentabilidade no tempo e no espaço.
     As hortaliças são, em muitos agroecosistemas, um componente chave para a diversificação, pois geralmente são de ciclo curto, o intervalo para o plantio também é curto, de uma semana a 15 dias em algumas espécies, a área ocupada por ciclo de cultivo é variável dependendo da espécie, o que facilita o redesenho das propriedades. Ainda, o retorno econômico é rápido e alguns produtos exigem pouco processamento, podendo ser vendidos in natura e são de fácil aceitação no mercado.
     Contudo, ainda existem muitos desafios para o desenvolvimento do sistema produtivo de hortaliças orgânicas. São muitos os problemas enfrentados pelos agricultores especialmente no que diz respeito ao manejo de solo e controle de pragas, doenças e plantas espontâneas. São esses alguns exemplos que limitam muitas vezes, o crescimento de áreas produtivas no sistema orgânico. Assim, vamos discutir nesse trabalho os desafios e as propostas para incrementar o sistema de produção de olerícolas orgânicas.

PROBLEMAS
      Atualmente, o campo sofre as conseqüências da simplificação da agricultura, que seguiu o modelo da monocultura preconizado pela Revolução verde. São algumas dessas conseqüências: erosão, contaminação de solos e mananciais hídricos, desequilíbrios biológicos e crescente resistência das pragas aos agrotóxicos. A necessidade de mudança para uma estratégia mais conservacionista e preservacionista da agricultura é urgente.
     A conversão à horticultura orgânica bem como seu manejo exigem profundos conhecimentos agronômicos e ecológicos, como também das particularidades da propriedade rural, da qualidade e quantidade dos recursos humanos (Souza e Resende, 2006) e ainda da paciência e persistência do agricultor. Essas questões aliadas à falta de tecnologia para a produção, de assistência técnica especializada e canais de comercialização dos produtos, são os problemas mais importantes apontados pelos agricultores.
     Não são somente as questões relacionadas diretamente ao agricultor e seu sistema produtivo mais a preocupação da sociedade pelo consumo de alimentos mais “limpos” exigem cada vez mais do mercado a oferta de produtos oriundos de agricultura orgânica. Um exemplo muito cotidiano é o caso da presença elevada de nitratos nas hortaliças. A elevação do teor de nitrato nas plantas se dá pela oferta excessiva de adubos nitrogenados especialmente nas hortaliças folhosas de consumo in natura. O problema neste caso está relacionado ao efeito do nitrato na saúde humana que uma vez ingerido, pode ser transformado em nitrito e combinarse com as aminas para formar as nitrosaminas. Essas substâncias são cancerígenas, mutagênicas e teratogênicas (Darolt, 2003).
     Essas e outras questões fazem parte do debate atual na sociedade e leva a um repensar das formas de produção e consumo e das nossas relações com a indústria da alimentação.

LIMITAÇÕES
     Apesar dos avanços das pesquisas em horticultura orgânica ainda assim, existem pontos de limitação importantes a serem considerados e que influenciam a opção por adotar esse sistema.
     Segundo um levantamento das demandas da pesquisa encaminhadas pelas Comissões de Produção Orgânica (CPOrg) de distintos estados do país, sanidade vegetal, sistemas de produção vegetal e animal, processamento de alimentos e questões de socioeconomia como os sistemas de comercialização de produtos orgânicos são os temas mais importantes e que necessitam atuação direta do componente pesquisa e extensão. Mesmo que alguns desses fatores tenham sido explorados na literatura com a apresentação de resultados, ainda existem pontos específicos que precisam ser mais bem estudados e adaptados as condições inerentes à produção orgânica.
     Uma questão bastante recorrente e que é apontada como um limitante para a conversão ao sistema produtivo é o preço do produto orgânico. As dimensões éticas, sociais e ambientais que apresenta a agricultura orgânica não podem ser desconsideradas principalmente quando se discute o preço dos produtos orgânicos. Por suas características, a agricultura orgânica tem contribuído para a fixação no campo de um expressivo contingente de produtores familiares anteriormente excluídos. Os consumidores dos produtos orgânicos, ao priorizarem sua saúde e bem estar estão conscientes de que também promovem a qualidade de vida e saúde para os trabalhadores rurais e na conservação do meio ambiente (Valle et al., 2007). Outro fator relacionado ao preço é que o mercado orgânico ainda é visto como uma estratégia ou nicho de mercado principalmente pelos grandes centros de distribuição que reduzem sua margem de lucro, elitizando os produtos.
     As limitações da horticultura orgânica não podem estar baseadas nos preços de produção e consumo, pois quando se compara com o sistema convencional, observa-se que os custos variáveis de produção são mais baixos para algumas culturas no sistema orgânico (Vilela et al., 2007). Em um estudo comparativo entre os sistemas de cultivo de soja orgânica e convencional do ano de 2002 (Darolt e Skora Neto, 2002) foi constatado que tanto em adubos como em insumos para controle de doenças, os custos no sistema orgânico foram menores comparativamente ao convencional.
      Outras questões consideradas por muitas como limitações tais como mão de obra e acesso a informação, devem ter uma reflexão mais profunda da forma como são percebidas no sistema orgânico.

SOLUÇÕES TÉCNICAS
     Com base nesse panorama, muito se avançou nas soluções técnicas que auxiliam o sistema de produção de hortaliças orgânicas.
     A Embrapa enquanto empresa pública de pesquisa e tecnologias atua também nas áreas de capacitação e transferência de tecnologias, subsidiando a construção de políticas públicas e de mercado, gerando conhecimentos não somente para o sistema de produção orgânico mais também para os processos de transição e na sistematização de experiências dos agricultores.
     No processo de transição agroecológica, já existem esforços para sistematização de experiências de agricultores em distintas regiões do país. Essas experiências nos trazem informações sobre como a diversidade e as relações com a produção são tratadas. Por exemplo, na região Serrana do Rio de Janeiro onde a introdução de caprinos leiteiros e galinhas poedeiras, de forma a ampliar a oferta de alimentos (ovos, leite e carne) e de dejetos, foram destinadas a complementar a adubação orgânica das áreas cultivadas com hortaliças. Desta forma, buscou-se reduzir a dependência das unidades em relação a insumos externos e, principalmente, diversificar a renda da unidade e garantir a segurança alimentar da família. As áreas de lavouras foram manejadas dentro dos princípios da agricultura orgânica e são certificadas pela ABIO, ao passo que, em relação ao manejo do componente animal buscou-se incorporar práticas agroecológicas de forma a caracterizar processos de transição de sistemas de manejo.
     Uma vez implantado o sistema de produção, o mais importante é reconhecer que existe a integração entre os diferentes componentes desse sistema e que isso demanda o desenvolvimento de pesquisas transdisciplinares, o que muitas vezes é dificultado. Quando se trata de produção de hortaliças, considera-se principalmente a conservação do solo e da água, fertilidade do solo, controle de pragas e doenças e manejo de plantas espontâneas. Considerando esses fatores, o objetivo é desenvolver tecnologias e estratégias de manejo que produzam sinergismo entre eles.
     Sobre a fitosanidade, por exemplo, existem resultados concretos que comprovam que o uso da diversidade pode controlar pragas, como o consórcio do tomate com coentro e botão de ouro em sistema orgânico responsável por reduzir a abundância de pragas (Medeiros et al., 2009). Outro exemplo é o uso de plantas aromáticas como a hortelã e o manjericão ou alfavaca, para controlar a hérnia das crucíferas quando cultivadas previamente a couve chinesa (Vidal, 2010).
     São muitas as experiências de sucesso que mostram resultados importantes de pesquisa para o avance da agricultura orgânica. Recentemente, foi realizado pela Embrapa o zoneamento agroecológico de Mato Grosso do Sul, e que servirá de base para o planejamento territorial, no sentido de diversificar os cultivos agrícolas. As atividades dominantes em Mato Grosso do Sul, atualmente, são a pecuária e o plantio da soja e um dos pontos da pesquisa foi o levantamento de aptidão para mais de 15 culturas, incluindo, além da soja, abacaxi, banana, eucalipto, girassol, citros, goiaba, seringueira, milho e hortaliças entre outras.
     Como reflexão final é importante considerar que enquanto a agricultura orgânica for tratada pela indústria da alimentação como um nicho de mercado e não conseguir ser vista pela importância na segurança alimentar que apresenta, as discussões seguirão relacionadas ao preço final pago pelo produtor e consumidor. Os sistemas orgânicos são inspiradores de um novo paradigma no modo de conceber a agricultura. As adaptações necessárias em face das mudanças climáticas globais exigem que os sistemas sejam resilientes, com habilidade para continuar funcionando mesmo sob eventos inesperados. Os agricultores familiares, os mais vulneráveis a todas essas transformações, necessitam de práticas naturais mais adaptadas às adversidades locais com o passar do tempo. E é aí que a agricultura orgânica desponta como alternativa potencial, pois se baseia nos processos ecológicos e melhor uso dos recursos naturais para desenvolver a resiliência através do desenvolvimento de técnicas de uso e manejo correto do solo, água, biodiversidade e paisagem, combinando o conhecimento tradicional das comunidades com o conhecimento científico, melhor adaptado às condições dos ecossistemas locais e regionais.

REFERÊNCIAS

DAROLT, MR. 2003. A qualidade dos alimentos orgânicos. Disponível em: http://www.planetaorganico.com.br/daroltqualid.htm. Acessado em 26/05/2011.

DAROLT, MR; SKORA NETO, F. 2002. Sistema de plantio direto em agricultura orgânica. Disponível em: http://www.aeadf.org.br/noticias/pdf/Sistema%20de%20Plantio%20Direto%20em%20Ag ricultura%20Org%C3%A2nica.pdf. Acessado em 30/05/2011.

MEDEIROS, MA; SUJII, ER; MORAIS, HC. 2009. Effect of plant diversification on abundance of South American tomato pinworm and predators in two cropping systems. Horticultura Brasileira 27: 300-306.

PRETTY, J; SUTHERLAND, WJ; ASHBY, J et al. 2010. The top 100 questions of importance to the future of global agriculture. International Journal Of Agricultural Sustainability 8: 219-236.

SOUZA, JL; RESENDE, P. 2006. Manual de Horticultura Orgânica. 2 ed. Viçosa: Ed. Aprenda fácil. 843p. VALLE, JCV; CARNEIRO, RG; HENZ, GP. 2007. Mercado e comercialização. In: HENZ, GP; ALCÂNTARA, FA; RESENDE, FV. Produção Orgânica de Hortaliças. Brasília; Embrapa Informação Tecnológica. p. 227-236. VIDAL, M.C. Efecto de la asociación de plantas aromáticas com Brassica spp. em el control de la hernia de las crucíferas (Plasmodiophora brassicae Woron.). 2010. 152f. Tese (Doutorado Agroecología, Sociología y Desarrollo Rural Sostenible) – Instituto de Sociologia y Estudios Campesinos, Universidade de Córdoba, Espanha. 2010.


VILELA, NJ; RESENDE, FV; CARNEIRO, RG. 2007. Custos de produção. In: HENZ, GP; ALCÂNTARA, FA; RESENDE, FV. Produção Orgânica de Hortaliças. Brasília; Embrapa Informação Tecnológica. p. 237-245.
Ferreira On 5/10/2018 10:36:00 AM Comentarios

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quinta-feira, 10 de maio de 2018

Cultivo Orgânico de Hortaliças

Autor: Mariane Carvalho Vidal - Embrapa Hortaliças, Caixa Postal 218, CEP 70359-970, Brasília, DF. mariane@cnph.embrapa.br

Fonte: Hortic. bras., v.29, n. 2 (Suplemento - CD ROM), julho 2011.


INTRODUÇÃO
     No artigo publicado no ano passado sobre as 100 questões mais importantes para o futuro da agricultura global (Pretty et al., 2010), a sustentabilidade aparece como ponto fundamental para o desafio de alimentar uma população do ordem de 9 bilhões de pessoas projetada para um futuro próximo. Dessa forma, o panorama para os próximos anos indica a necessidade de profundos câmbios em nosso sistema produtivo.
     O cultivo orgânico aparece não somente como uma forma alternativa ao sistema agroindustrial atual da agricultura mais, como uma forte base para uma mudança de paradigma da relação da sociedade com a agricultura. O resgate das questões sociais, ecológicas e ambientais no trato com a agricultura é o grande diferencial desse sistema, pois permite a equidade e o equilíbrio das relações e a sua sustentabilidade no tempo e no espaço.
     As hortaliças são, em muitos agroecosistemas, um componente chave para a diversificação, pois geralmente são de ciclo curto, o intervalo para o plantio também é curto, de uma semana a 15 dias em algumas espécies, a área ocupada por ciclo de cultivo é variável dependendo da espécie, o que facilita o redesenho das propriedades. Ainda, o retorno econômico é rápido e alguns produtos exigem pouco processamento, podendo ser vendidos in natura e são de fácil aceitação no mercado.
     Contudo, ainda existem muitos desafios para o desenvolvimento do sistema produtivo de hortaliças orgânicas. São muitos os problemas enfrentados pelos agricultores especialmente no que diz respeito ao manejo de solo e controle de pragas, doenças e plantas espontâneas. São esses alguns exemplos que limitam muitas vezes, o crescimento de áreas produtivas no sistema orgânico. Assim, vamos discutir nesse trabalho os desafios e as propostas para incrementar o sistema de produção de olerícolas orgânicas.

PROBLEMAS
      Atualmente, o campo sofre as conseqüências da simplificação da agricultura, que seguiu o modelo da monocultura preconizado pela Revolução verde. São algumas dessas conseqüências: erosão, contaminação de solos e mananciais hídricos, desequilíbrios biológicos e crescente resistência das pragas aos agrotóxicos. A necessidade de mudança para uma estratégia mais conservacionista e preservacionista da agricultura é urgente.
     A conversão à horticultura orgânica bem como seu manejo exigem profundos conhecimentos agronômicos e ecológicos, como também das particularidades da propriedade rural, da qualidade e quantidade dos recursos humanos (Souza e Resende, 2006) e ainda da paciência e persistência do agricultor. Essas questões aliadas à falta de tecnologia para a produção, de assistência técnica especializada e canais de comercialização dos produtos, são os problemas mais importantes apontados pelos agricultores.
     Não são somente as questões relacionadas diretamente ao agricultor e seu sistema produtivo mais a preocupação da sociedade pelo consumo de alimentos mais “limpos” exigem cada vez mais do mercado a oferta de produtos oriundos de agricultura orgânica. Um exemplo muito cotidiano é o caso da presença elevada de nitratos nas hortaliças. A elevação do teor de nitrato nas plantas se dá pela oferta excessiva de adubos nitrogenados especialmente nas hortaliças folhosas de consumo in natura. O problema neste caso está relacionado ao efeito do nitrato na saúde humana que uma vez ingerido, pode ser transformado em nitrito e combinarse com as aminas para formar as nitrosaminas. Essas substâncias são cancerígenas, mutagênicas e teratogênicas (Darolt, 2003).
     Essas e outras questões fazem parte do debate atual na sociedade e leva a um repensar das formas de produção e consumo e das nossas relações com a indústria da alimentação.

LIMITAÇÕES
     Apesar dos avanços das pesquisas em horticultura orgânica ainda assim, existem pontos de limitação importantes a serem considerados e que influenciam a opção por adotar esse sistema.
     Segundo um levantamento das demandas da pesquisa encaminhadas pelas Comissões de Produção Orgânica (CPOrg) de distintos estados do país, sanidade vegetal, sistemas de produção vegetal e animal, processamento de alimentos e questões de socioeconomia como os sistemas de comercialização de produtos orgânicos são os temas mais importantes e que necessitam atuação direta do componente pesquisa e extensão. Mesmo que alguns desses fatores tenham sido explorados na literatura com a apresentação de resultados, ainda existem pontos específicos que precisam ser mais bem estudados e adaptados as condições inerentes à produção orgânica.
     Uma questão bastante recorrente e que é apontada como um limitante para a conversão ao sistema produtivo é o preço do produto orgânico. As dimensões éticas, sociais e ambientais que apresenta a agricultura orgânica não podem ser desconsideradas principalmente quando se discute o preço dos produtos orgânicos. Por suas características, a agricultura orgânica tem contribuído para a fixação no campo de um expressivo contingente de produtores familiares anteriormente excluídos. Os consumidores dos produtos orgânicos, ao priorizarem sua saúde e bem estar estão conscientes de que também promovem a qualidade de vida e saúde para os trabalhadores rurais e na conservação do meio ambiente (Valle et al., 2007). Outro fator relacionado ao preço é que o mercado orgânico ainda é visto como uma estratégia ou nicho de mercado principalmente pelos grandes centros de distribuição que reduzem sua margem de lucro, elitizando os produtos.
     As limitações da horticultura orgânica não podem estar baseadas nos preços de produção e consumo, pois quando se compara com o sistema convencional, observa-se que os custos variáveis de produção são mais baixos para algumas culturas no sistema orgânico (Vilela et al., 2007). Em um estudo comparativo entre os sistemas de cultivo de soja orgânica e convencional do ano de 2002 (Darolt e Skora Neto, 2002) foi constatado que tanto em adubos como em insumos para controle de doenças, os custos no sistema orgânico foram menores comparativamente ao convencional.
      Outras questões consideradas por muitas como limitações tais como mão de obra e acesso a informação, devem ter uma reflexão mais profunda da forma como são percebidas no sistema orgânico.

SOLUÇÕES TÉCNICAS
     Com base nesse panorama, muito se avançou nas soluções técnicas que auxiliam o sistema de produção de hortaliças orgânicas.
     A Embrapa enquanto empresa pública de pesquisa e tecnologias atua também nas áreas de capacitação e transferência de tecnologias, subsidiando a construção de políticas públicas e de mercado, gerando conhecimentos não somente para o sistema de produção orgânico mais também para os processos de transição e na sistematização de experiências dos agricultores.
     No processo de transição agroecológica, já existem esforços para sistematização de experiências de agricultores em distintas regiões do país. Essas experiências nos trazem informações sobre como a diversidade e as relações com a produção são tratadas. Por exemplo, na região Serrana do Rio de Janeiro onde a introdução de caprinos leiteiros e galinhas poedeiras, de forma a ampliar a oferta de alimentos (ovos, leite e carne) e de dejetos, foram destinadas a complementar a adubação orgânica das áreas cultivadas com hortaliças. Desta forma, buscou-se reduzir a dependência das unidades em relação a insumos externos e, principalmente, diversificar a renda da unidade e garantir a segurança alimentar da família. As áreas de lavouras foram manejadas dentro dos princípios da agricultura orgânica e são certificadas pela ABIO, ao passo que, em relação ao manejo do componente animal buscou-se incorporar práticas agroecológicas de forma a caracterizar processos de transição de sistemas de manejo.
     Uma vez implantado o sistema de produção, o mais importante é reconhecer que existe a integração entre os diferentes componentes desse sistema e que isso demanda o desenvolvimento de pesquisas transdisciplinares, o que muitas vezes é dificultado. Quando se trata de produção de hortaliças, considera-se principalmente a conservação do solo e da água, fertilidade do solo, controle de pragas e doenças e manejo de plantas espontâneas. Considerando esses fatores, o objetivo é desenvolver tecnologias e estratégias de manejo que produzam sinergismo entre eles.
     Sobre a fitosanidade, por exemplo, existem resultados concretos que comprovam que o uso da diversidade pode controlar pragas, como o consórcio do tomate com coentro e botão de ouro em sistema orgânico responsável por reduzir a abundância de pragas (Medeiros et al., 2009). Outro exemplo é o uso de plantas aromáticas como a hortelã e o manjericão ou alfavaca, para controlar a hérnia das crucíferas quando cultivadas previamente a couve chinesa (Vidal, 2010).
     São muitas as experiências de sucesso que mostram resultados importantes de pesquisa para o avance da agricultura orgânica. Recentemente, foi realizado pela Embrapa o zoneamento agroecológico de Mato Grosso do Sul, e que servirá de base para o planejamento territorial, no sentido de diversificar os cultivos agrícolas. As atividades dominantes em Mato Grosso do Sul, atualmente, são a pecuária e o plantio da soja e um dos pontos da pesquisa foi o levantamento de aptidão para mais de 15 culturas, incluindo, além da soja, abacaxi, banana, eucalipto, girassol, citros, goiaba, seringueira, milho e hortaliças entre outras.
     Como reflexão final é importante considerar que enquanto a agricultura orgânica for tratada pela indústria da alimentação como um nicho de mercado e não conseguir ser vista pela importância na segurança alimentar que apresenta, as discussões seguirão relacionadas ao preço final pago pelo produtor e consumidor. Os sistemas orgânicos são inspiradores de um novo paradigma no modo de conceber a agricultura. As adaptações necessárias em face das mudanças climáticas globais exigem que os sistemas sejam resilientes, com habilidade para continuar funcionando mesmo sob eventos inesperados. Os agricultores familiares, os mais vulneráveis a todas essas transformações, necessitam de práticas naturais mais adaptadas às adversidades locais com o passar do tempo. E é aí que a agricultura orgânica desponta como alternativa potencial, pois se baseia nos processos ecológicos e melhor uso dos recursos naturais para desenvolver a resiliência através do desenvolvimento de técnicas de uso e manejo correto do solo, água, biodiversidade e paisagem, combinando o conhecimento tradicional das comunidades com o conhecimento científico, melhor adaptado às condições dos ecossistemas locais e regionais.

REFERÊNCIAS

DAROLT, MR. 2003. A qualidade dos alimentos orgânicos. Disponível em: http://www.planetaorganico.com.br/daroltqualid.htm. Acessado em 26/05/2011.

DAROLT, MR; SKORA NETO, F. 2002. Sistema de plantio direto em agricultura orgânica. Disponível em: http://www.aeadf.org.br/noticias/pdf/Sistema%20de%20Plantio%20Direto%20em%20Ag ricultura%20Org%C3%A2nica.pdf. Acessado em 30/05/2011.

MEDEIROS, MA; SUJII, ER; MORAIS, HC. 2009. Effect of plant diversification on abundance of South American tomato pinworm and predators in two cropping systems. Horticultura Brasileira 27: 300-306.

PRETTY, J; SUTHERLAND, WJ; ASHBY, J et al. 2010. The top 100 questions of importance to the future of global agriculture. International Journal Of Agricultural Sustainability 8: 219-236.

SOUZA, JL; RESENDE, P. 2006. Manual de Horticultura Orgânica. 2 ed. Viçosa: Ed. Aprenda fácil. 843p. VALLE, JCV; CARNEIRO, RG; HENZ, GP. 2007. Mercado e comercialização. In: HENZ, GP; ALCÂNTARA, FA; RESENDE, FV. Produção Orgânica de Hortaliças. Brasília; Embrapa Informação Tecnológica. p. 227-236. VIDAL, M.C. Efecto de la asociación de plantas aromáticas com Brassica spp. em el control de la hernia de las crucíferas (Plasmodiophora brassicae Woron.). 2010. 152f. Tese (Doutorado Agroecología, Sociología y Desarrollo Rural Sostenible) – Instituto de Sociologia y Estudios Campesinos, Universidade de Córdoba, Espanha. 2010.


VILELA, NJ; RESENDE, FV; CARNEIRO, RG. 2007. Custos de produção. In: HENZ, GP; ALCÂNTARA, FA; RESENDE, FV. Produção Orgânica de Hortaliças. Brasília; Embrapa Informação Tecnológica. p. 237-245.

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